Não se sabe ainda o que vai ocorrer com a carta apostólica Summorum Pontificum, se o papa Francisco a ab-rogará ou se reformará a lei promulgada por Bento XVI em 2007. A referida norma jurídica rege o uso da chamada forma extraordinária da missa. O certo é que os rumores de mudança são cada vez mais fortes. Por quê? Infelizmente houve abusos.
O principal desvio diz respeito à relação inextricável entre "missa tridentina" e desprezo pelo caráter vinculante do Concílio Vaticano II. De fato, a maioria dos que vociferam pela "missa de sempre", sem ser papas e nem haver sequer se sentado na banca de faculdade de teologia, ousam contestar o vigésimo-primeiro concílio ecumênico.
A propósito, o Vaticano II é o único concílio da história da Igreja arbitrada por três santos: são João XXIII, são Paulo VI e são João Paulo II. O primeiro santo sumo pontífice convocou o festejado concílio, o s egundo o concluiu e o terceiro o viabilizou, através sobretudo da promulgação dos dois códigos canônicos. Desta postura antieclesial surgem corolários gravíssimos, tais como a negação da validade da missa na forma ordinária. Com efeito, alguns irmãos, embaixadas em um livro duvidoso, chamado Catecismo Católico da Crise na Igreja, insinuam a nulidade da missa do qual noventa e nove por cento dos católicos participamos. Estranho que esses mesmos amantíssimos irmãos têm se insurgido contra os bispos, por tolerar o fechamento das igrejas recentes. Ora, não é írrita a missa na forma ordinária?
Outro problema seriíssimo tange ao fato de que determinados grupos "tridentinos" ou criticam o papa Francisco abertamente ou, pior, relegam-no a segundo plano, num gélido esquecimento. Mas, o papa é o sustentáculo lapídeo da Igreja Católica (Mt 16, 18).
No fundo, criou-se sobremaneira na mente de muitos jovens incautos – os próceres da "missa tridentina" – certo deslumbramento pela estética da forma extraordinária. Deslembram-se, contudo, que o missal de são Paulo VI também frui de pulcritude e santidade, se o celebrante observar como rubricas. A lamentável malversação da liturgia não justifica, mas pode explicar o porquê da repugnância juvenil pela "missa nova".
De qualquer modo, obviamente se salvaguardar os direitos adquiridos de associações como, por exemplo, a Fraternidade São Pio X.
Sem embargo, o mais relevante de tudo é frisar – na trilha do que escreveu o papa emérito na obra "Jesus de Nazaré" – que a missa deve obrigar ao amor do próximo, por causa de Deus: "A caritas , a solicitude pelo outro, não é um segundo setor do cristianismo, a par do culto, mas está radicada precisamente nele e faz parte dele" (obra citada, editora Principia, parte II, p. 111). Permito-me afirma que constituirá sacrilégio participar da missa (leigo) ou mesmo dizê-la (sacerdote) sem tal estado de espírito! O papa Francisco no-lo adverte clarividentemente acerca do perigo de novo gnosticismo, o qual "supõe uma fé fechada no subjetivismo, onde apenas interessa experiência ou uma série de raciocínios ou conhecimentos que supostamente confortam e iluminam, mas, em última instância, a pessoa fica enclausurada na imanência de sua própria razão ou de seus sentimentos" (Gaudete et Exultsate, n. 36).
Aguardemos, com entusiasmo, como novíssimas manifestações legislativas desse grande papa reformador, Francisco, quem, dias atrás, promulgou o novo livro sexto do código canônico latino. Louvado seja Deus por tão eminente timoneiro a conduzir a barca de são Pedro! Edson Luiz Sampel
Professor da Faculdade de Direito Canônico São Paulo Apóstolo (da Arquidiocese de São Paulo).