A necessidade da Formação Permanente na Vida Religiosa:

Perspectiva Teológico-Jurídica do cân 661

 

 

Na perspectiva do Código de 1917 e dos documentos magisteriais emanados até o Concílio Vaticano II, a formação à vida religiosa era estrutura em função da preparação para o sacerdócio ou para a profissão religiosa. Uma vez assumido esse compromisso definitivamente, a pessoa era considerada formada e, conse-quentemente, pronta para assumir qualquer tipo de atividade, própria do carisma do Instituto. A partir da profissão perpétua, sobretudo os membros dos Institutos Religiosos femininos, deixavam de ser considerados sujeitos em formação; passavam a ser vistos como pessoas consagradas maduras, aptas a assumir para sempre o estilo de vida para o qual tinham sido preparadas, colocando em prática o que haviam recebido durante o tempo da formação inicial.

A partir do Concílio Vaticano II, especialmente com a contribuição oferecida pelo decreto Perfectae Caritatis, a formação à vida religiosa assume um caráter de continuidade, passando a ser compreendida como um processo de maturação que deve durar a vida inteira e não simplesmente como um tempo de preparação pedagógica para a Profissão. Mas serão os documentos do Magistério emanados posteriormente, que ajudarão a esclarecer melhor este novo modo de conceber a formação.

Um longo itinerário começa a ser trilhado pela formação permanente a partir do Concílio. Entre os anos setenta e oitenta, esta formação vai ser interpretada como uma série de cursos de aggiornamento teológico-doutrinal e profissional, reduzindo-se assim a meras atividades intelectuais, que nem sempre tocavam profundamente o coração dos religiosos, tornando-se ineficaz, pois estas atividades não provocavam a verdadeira renovação interior, idealizada pelos Padres Conciliares.

Com o novo Código de Direito Canônico de 1983, a formação permanente adquire maior solidez, passando a ser uma norma para todos os Institutos Religiosos, sejam eles femininos, masculinos, laicais ou clericais. Progressivamente, a formação permanente deixa de ser vista como cursos de aggiornamento meramente intelectual, para se transformar em um processo de crescimento global, que abrange essencialmente a esfera espiritual, doutrinal e prática. Os primeiros responsáveis por essa formação são os próprios religiosos.  Ao mesmo tempo, cabe aos superiores maiores oferecer e providenciar os meios e as condições necessárias para que todos os membros do Instituto possam se colocar nessa dinâmica de crescimento contínuo, ao longo de toda a vida.

Um novo impulso à formação permanente será oferecido por alguns Documentos Magisteriais, publicados a partir dos anos noventa, especialmente com a Instrução Potissimum Institutionis, a Exortação Apostólica pós-sinodal Vita Consecrata e a Instrução Partir de Cristo.  A partir destes incisivos pronunciamentos oficiais, a formação permanente passa a ser vista como algo que deve vir de encontro aos anseios mais profundos dos religiosos e oferecer-lhes os instrumentos necessários para assumir com fidelidade criativa as diversas circunstâncias do cotidiano. O objetivo da formação permanente é despertar e fazer crescer na pessoa consagrada aquela disponibilidade e docilidade interior que a torna capaz de deixar-se formar a cada dia, através de tudo o que ela realiza.

Essas orientações emanadas pelo Magistério passaram a ser estudadas e aprofundadas com grande interesse por teólogos e canonistas, preocupados em oferecer aos religiosos novas inspirações e perspectivas, que os ajudassem a assumir com coragem e discernimento os inúmeros desafios do mundo pós-moderno.

Na America Latina, a CLAR tem procurado oferecer uma grande contribuição neste sentido. Também a Conferência dos Religiosos do Brasil, nos últimos anos, publicou vários estudos e reflexões sobre a formação permanente. Apesar de todo esse esforço, a CRB não dispõe de um plano de formação permanente, que possa servir de base para todos os Institutos Religiosos, talvez pela própria complexidade da realidade brasileira e pelas características próprias de cada Instituto. Existem apenas alguns itinerários formativos, elaborados por equipes regionais de formadores.

Analisando esses itinerários regionais, se percebe um novo impulso à formação permanente na vida religiosa consagrada do Brasil. Os Institutos Religiosos estão sentindo cada vez mais a necessidade de fortalecer a cotidiana formação, primando pelo cultivo dos elementos essenciais, que alimentam, sustentam e revigoram a vida religiosa dos seus membros.

Todo esse itinerário percorrido pela formação permanente na normativa canônica, pode ser visto também ao interno da normativa fundamental da Congregação das Irmãs Franciscanas de São José. Analisando os escritos da fundadora, as Constituições Gerais, os Diretórios e documentos provinciais de formação, desde o início até o presente, se percebe uma grande evolução na concepção da formação permanente. Hoje se tende a compreender a formação permanente como processo de crescimento integral, que acompanha a candidata desde os primeiros passos do despertar vocacional até o último instante da vida.

Diante do vasto leque de posicionamentos que surgiram sobre os métodos a serem aplicados na formação dos religiosos, optei por estudar, não os métodos, mas o conteúdo que deve estar na base desta formação integral e permanente.

Considerando, porém, que vários pensadores já haviam dedicado muita energia na clarificação do argumento, procurei demonstrar que a formação permanente não deve ser compreendida como uma etapa subsequente à formação inicial, precisamente a partir da profissão perpétua, mas como fundamento de todo o caminho vocacional da pessoa que abraça a vida religiosa, desde o despertar vocacional até a sua consumação final.

No primeiro capítulo procurei analisar os elementos que comprovam a necessidade da formação permanente na vida religiosa consagrada, partindo da análise da normativa canônica do Código de 1917, passando depois para os documentos emanados pelo Magistério até o ano de 2005, dando especial atenção à normativa do atual Código de 1983.

Ao iniciar o estudo da formação permanente na normativa do Código de 1917, na parte dedicada ao Direito Comum dos religiosos, o primeiro obstáculo que se encontra é com relação à terminologia. De fato, o Código não usa de modo explícito o termo formação permanente e nem apresenta uma definição de tal formação. Todavia, ao ler nas entrelinhas da normativa - a partir dos elementos enumerados como essenciais às diversas etapas de formação - se pode intuir a concepção de formação que o Legislador, indiretamente, deixa transparecer, e com isso se pode enumerar elementos considerados essenciais para a formação permanente.

Os elementos evidenciados pelo Código, que contribuem à formulação de um conceito de formação, podem ser assim relacionados: a) as condições para a aceitação dos candidatos em uma Religião,[1] (cân. 544); b) a reta intenção (cân. 538); c) a idoneidade para assumir os compromissos próprios da vida religiosa (cân. 538, cân. 571, §2); d) as condições para a validade do noviciado (cân. 555-556);  e) a provação dos candidatos durante o noviciado e no período dos votos temporários (cân. 562-563, cân. 575, §1). Sobretudo este último elemento - a provação dos candidatos - que deve ser feita segundo a disciplina religiosa estabelecida pelas Constituições da Religião, constitui um elemento fundamental em todas as etapas de formação, mas especialmente no noviciado, tornando-se para o mestre de noviços um sério compromisso.

A disciplina, regularmente observada na casa do noviciado - e nas outras casas de formação em geral - é apresentada como condição-base, para que se possa acolher os candidatos. Trata-se de uma disciplina de observância, que favorece a provação dos noviços, entendida como um dos principais objetivos desta etapa.

Quanto aos conteúdos a serem aprofundados e ao método a ser aplicado no noviciado, o Código no cân. 565 § 1 estabelece que a formação dos noviços seja feita através do estudo da Regra e Constituições, das pias meditações e da oração assídua, do estudo de quanto se refere à observância dos votos e das virtudes, com oportunos exercícios que ajudem a extirpar radicalmente a fonte dos vícios, levando-os a tender à perfeição do próprio estado de vida.

Daquilo que se pode intuir, a formação no noviciado era destinada especialmente a preparar espiritualmente os candidatos, para assumir as exigências do estilo de vida que estavam para abraçar. Isso se realizava através de um adequado tempo de experiência (provação) que envolvia o candidato e a Religião: ao candidato era oferecida a oportunidade de verificar a sua capacidade de sujeitar-se à disciplina religiosa daquele Instituto; ao Instituto era dada a possibilidade de conhecer os dotes e a personalidade do candidato, avaliando se possuía ou não, os requisitos e as inclinações necessárias para poder ser aceito naquele Instituto.

Os anos da profissão temporária - o último período formativo estabelecido pelo Código era aquele que ia da profissão temporária até a profissão perpétua, como uma continuação do "tempo de provação" do noviciado. Todavia, somente os religiosos destinados à Ordem Sacerdotal deviam continuar a receber, neste período, uma formação religiosa sistemática. O Código não estabelecia a continuidade da formação intelectual aos membros leigos das Religiões clericais e nem aos religiosos das Religiões laicais. Os religiosos simples deviam somente continuar com perseverança e radicalidade na observância dos votos, para ver se realmente seriam capazes de assumir, por toda a vida esse estilo de vida. Deviam também ser inseridos nos trabalhos próprios do carisma, procurando descobrir as suas próprias potencialidades e inclinações, em vista de uma futura missão na própria Religião. Competia aos Superiores favorecer aos candidatos o crescimento no espírito próprio do Instituto, sobretudo colocando-os em comunidades religiosas que vivessem de maneira exemplar o carisma do fundador.

Aos professos, candidatos ao sacerdócio, o Código estabelecia o plano de estudos que devia ser seguido nas Religiões Clericais, ilustrando detalhadamente as exigências próprias desta etapa e os conteúdos a serem transmitidos.

Mas será que a instrução recebida nestas etapas iniciais da formação, era suficiente para manter os religiosos fiéis aos compromissos assumidos com a profissão religiosa, durante toda a vida? Quais instrumentos os religiosos tinham à disposição, após a profissão perpétua, para continuar com perseverança na observância dos votos e das virtudes, até alcançar a perfeição do próprio estado de vida?

Com o auxílio do próprio CIC-1917, se podem delinear alguns elementos essenciais:

a) O ingresso definitivo dos candidatos e candidatas na Religião não acontecia de um momento para outro, mas depois de um processo que se realizava progressivamente: partindo da primeira experiência do postulado, se passava ao noviciado e depois à profissão religiosa, até chegar a incorporação definitiva com a emissão dos votos perpétuos e/ou Ordenação Sacerdotal.

b) O caráter peculiar da formação inicial, especialmente do noviciado, era constituído pelo elemento "provação", que se realizava através do confronto entre os dois principais interessados: o candidato e o Instituto. Os conteúdos e as modalidades da formação eram estabelecidos a partir de duas diretrizes básicas: 1) a espiritualidade e a disciplina da Religião, prescritas pelas próprias Constituições; 2) as atividades apostólicas com a qual a Religião marcava a sua presença na Igreja e no mundo.

c) Os religiosos candidatos ao Sacerdócio, nas Religiões Clericais, deviam continuar a formação intelectual depois do noviciado, através da Ratio Studiorum: um programa de estudos, que favorecia uma severa preparação ao Sacerdócio. Este aprofundamento doutrinal devia prolongar-se durante os primeiros cinco anos de vida apostólica ministerial.[2]

d) O Código não estabelecia uma formação sistemática aos religiosos dos Institutos Laicais após a profissão religiosa. Portanto, o único momento formativo previsto para esta categoria de religiosos  era constituído pelo ano de postulantado e noviciado. Isso seria insuficiente, se aos Institutos não fosse concedida a faculdade de organizar atividades formativas específicas para cada etapa. O próprio conceito de provação, como critério de avaliação e seleção, que reaparece no cân. 575, § 2, deixa transparecer que o triênio dos votos temporários, devia ser um tempo de intensiva maturação da própria vocação. Ao emitir os votos perpétuos, os membros do Instituto deviam ser considerados aptos para assumir com responsabilidade os futuros desafios da vida de total consagração, naquela determinada Religião.

e) A partir da profissão perpétua, todos os religiosos indistintamente (clérigos e leigos), deviam permanecer - por toda a vida - fiéis aos ensinamentos recebidos nos anos de formação inicial, para poderem alcançar a perfeição do próprio estado de vida.[3] Neste sentido, se poderia dizer que a formação continuava sim, mas de uma maneira bem concreta e encarnada na realidade cotidiana. Não se tinha mais o acompanhamento direto de um "mestre", como na formação inicial, mas se podia contar com a ajuda de outros instrumentos, particularmente com o apoio e o testemunho dos membros mais experientes da comunidade, dos superiores e do diretor espiritual.

Analisando este e outros documentos emanados até os anos sessenta, é possível perceber uma continuidade dinâmico-evolutiva entre a normativa do CIC-1917 e os documentos emanados posteriormente, mas ao mesmo tempo um salto de qualidade significativo, fruto do constante empenho da SCR em interpretar a "mens Legislatore". Contribuíram também para esta evolução, as experiências realizadas pelos Institutos religiosos, em vista de uma aplicação unívoca da normativa.

No que se refere à formação permanente, se poderia dizer que as bases foram lançadas por estes documentos, mas somente a partir do Concílio Vaticano II, foram emanadas normas concretas e específicas para a formação permanente de todos os religiosos, não somente àqueles endereçados à Ordenação Sacerdotal.

O Concílio Vaticano II, qual novo Pentecostes,[4] conduziu a Igreja - e com ela a vida religiosa - a rever as suas expectativas, os seus esforços, as suas conquistas, a sua atuação no mundo, em vista de uma profunda compreensão da realidade atual e abertura às exigências dos novos tempos, na busca de responder coerentemente aos novos interrogativos do homem contemporâneo, imerso num mundo secularizado e em constante evolução.

Merece relevância a consciência que surgiu a partir do Concílio, segundo a qual todos os membros do Instituto, devem entrar num processo de formação permanente. Portanto, os religiosos leigos (homens e mulheres) não serão mais considerados como de segunda classe, mas como sujeitos que têm o direito e o dever de receber uma adequada formação, durante toda a vida.

Uma multiplicidade de acontecimentos e circunstâncias contribuíram para a evolução da concepção e da normativa canônica sobre a formação permanente, como por exemplo: os novos condicionamentos da cultura, as vicissitudes sócio-políticas do período pós-guerra, as constantes exigências de adaptação aos novos tempos e de renovação da vida religiosa, as mudanças rápidas e inusitadas, os novos parâmetros sociais e assim por diante. Tudo isso levou, por obra de João XXIII, à celebração do Concílio Vaticano II, onde, os anseios e expectativas, os sofrimentos e as conquistas da Igreja e naturalmente - da vida religiosa - foram colocadas em confronto, reavaliadas, renovadas e revigoradas.

O decreto Perfectae Caritatis colocou em evidência a conexão entre a formação e a renovação da vida religiosa: A conveniente renovação dos Institutos depende, sobretudo, da formação dos membros (n. 18), recomendando vivamente aos membros de todos os Institutos, uma adequada formação, que se prolongue no tempo e abranja as três dimensões fundamentais da vida religiosa: espiritual, doutrinal e prática.

Movidos pela pungente necessidade de adaptar as próprias Normas Fundamentais, às circunstâncias dos novos tempos e às orientações dos documentos conciliares e pós-conciliares, os Institutos Religiosos (sobretudo os laicais), foram convidados a elaborar uma Ratio Institutionis completa, que garantisse a todos os religiosos uma efetiva formação permanente. Com isso, nos últimos quarenta e cinco anos, a formação permanente passou a ocupar um lugar de destaque, tanto nas reflexões e documentos Magisteriais, quanto nos Capítulos Gerais e Provinciais dos Institutos Religiosos, bem como nos estudos e assembléias da União dos Superirores Maiores, das Conferências Nacionais dos Religiosos e outros órgãos afins.

Todavia, a formação permanente encontrará a sua plena expressão e sistematização, na formulação do cânon 661, do novo Código de Direito Canônico de 1983, que, recolhendo os princípios inovadores oferecidos pelos documentos do Magistério, sobretudo a partir do Concílio, e as experiências realizadas pelos Institutos Religiosos, estabelece como norma, a necessidade de oferecer a todos os religiosos, os meios, as condições e as oportunidades de manter-se, por toda a vida, em contínuo processo de formação.

No CIC-1983, a formação permanente aparece em estreita relação com a formação das etapas iniciais. O cânon que a ela se dedica, foi colocado logo após aqueles que tratam da formação dos religiosos de profissão temporária. A formação permanente é como a argamassa que dá consistência, solidez, sustentação e mantêm unidos os tijolos do edifício formativo. É um processo que se realiza, em primeiro lugar, dentro da própria pessoa, através da contínua assimilação dos valores evangélicos, da cotidiana configuração a Cristo, da experiência pessoal e comunitária da vida de oração e intimidade com o Senhor, da meditação da Palavra de Deus, da participação assídua aos Sacramentos, da aplicação aos estudos e preparação profissional e do viver o compromisso apostólico em comunhão com toda a Igreja.

A formação permanente, segundo quanto estabelece o cân. 661 do atual Código é um processo de crescimento contínuo, que envolve a pessoa consagrada como um todo e durante toda a sua vida.[5] Abraça a esfera espiritual, doutrinal e prática. Devido à sua importância, deve ser garantida pelos superiores a todos os membros do Instituto.

A formação permanente, em harmoniosa continuidade com as etapas iniciais, realiza-se também por meio do empenho aos estudos próprios deste gênero de vida e daqueles direcionados a uma profissionalização e que contribuem a um eficaz serviço ao povo de Deus, segundo as modalidades peculiares do próprio carisma.

Sobretudo a partir da profissão perpétua, a formação permanente assume uma característica peculiar, tornando-se uma verdadeira exigência. Pois, em muitos Institutos Religiosos, somente depois da incorporação definitiva ao Instituto é que a pessoa é colocada diretamente em contato com as mais variadas atividades específicas do carisma, devendo, a partir de então, responder coerentemente às muitas situações embaraçosas e desafiantes do cotidiano.[6] Isso não significa que a formação permanente inicia a partir dos votos perpétuos, mas simplesmente assume uma configuração própria, passando a ser assumida, em primeiro lugar, pela própria pessoa consagrada. A formação inicial é já parte da formação permanente, enquanto serve para colocar as bases sobre as quais prosseguir, a partir dos votos perpétuos. Se a formação inicial for bem conduzida e aproveitada, a permanente será uma natural continuidade, não algo imposto pelos superiores.

Isso, porém, não isenta o superior e a própria comunidade religiosa de oferecer o ambiente e os meios necessários, para que essa formação se concretize no dia a dia. A comunidade é o lugar por excelência onde a vida consagrada se exprime e se desenvolve, na unidade dinâmica entre todos os membros, como sinal da vinda de Cristo e fonte de grande energia apostólica.[7] Os Superiores Maiores, através dos Capítulos Gerais e Provinciais devem dedicar especial atenção à formação dos seus membros, identificando os desafios a serem afrontados pelos mesmos no seu processo de formação permanente, a fim de proporcionar-lhes tudo o que, segundo as Constituições, estes necessitam para realizar o fim da própria vocação.[8]

O Magistério, depois da promulgação do novo Código, continuou a  ocupar-se da formação permanente dos religiosos. Emanando alguns documentos de capital importância neste sentido, demonstrou o contínuo interesse em reforçar e garantir a radicalidade da ‘sequela Christi' por parte dos religiosos e ao mesmo tempo, salvaguardar a identidade carismática própria de cada Família Religiosa.

Através da instrução Potissimum Institutionis, a Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica ofereceu à vida religiosa preciosos critérios de orientação sobre a formação permanente, que serviram de base para a revisão ou elaboração da Ratio Institutionis, requerida pelos cânones 650 e 659 §§ 2-3 do CIC-1983. Segundo a instrução, a formação permanente, deve vir de encontro às necessidades pessoais e comunitárias dos religiosos, oferecendo-lhes pistas e instrumentos que os ajudem a assumir com fidelidade criativa, as diversas circunstâncias da existência.

O Papa João Paulo II, na exortação apostólica pós-sinodal Vita Consecrata, dedica alguns números à formação permanente, na sessão intitulada: Olhando para o futuro.[9] O significado é claro: sem uma adequada formação, não se pode responder aos desafios de hoje e do futuro (cfr. VC, n.110), pois a verdadeira derrota da vida consagrada, não está no declínio numérico, mas no desfalecimento da adesão espiritual ao Senhor e à própria vocação e missão (cfr. VC, n.63).

Com a última instrução "Partir de Cristo", a Congregação para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica, quis, de algum modo, confirmar tudo aquilo que já tinha sido dito sobre a formação permanente nos documentos anteriores, porém com uma nova ênfase, ressaltando sobretudo  a importância do cultivo da vida espiritual. Neste documento, se pode verificar uma profunda atenção ao tema da formação permanente, pois são apresentadas uma série de atitudes que ajudam a dar novo vigor à dimensão formativa: particularmente o sair de si mesmo, através da abertura aos outros e a relação com o tempo, como forma de vencer o individualismo e o ativismo.

Tendo analisado, no primeiro capítulo, o pensamento e as orientações da Igreja Universal, em matéria de formação permanente na vida religiosa, desde o CIC-1917 até a instrução Partir de Cristo, a partir do segundo Capítulo se passou a analisar a formação permanente dos religiosos e religiosas inseridos no contexto da realidade brasileira, no esforço de oferecer algumas propostas concretas para a elaboração de um Plano de Formação que não faça dicotomia entre a fase inicial e pós-inicial da formação permanente.

Ao concluir o primeiro capítulo, se constatou que a concepção de formação à vida religiosa e especialmente de formação permanente, desde a promulgação do Código Pio-Beneditino (27 de maio de 1917), até a instrução Partir de Cristo (19 de maio de 2002), passou por uma série de modificações e uma substancial evolução. Se passou de uma concepção de formação pedagógica em vista da preparação para o Sacerdócio ou para a profissão religiosa, a uma concepção de formação como processo de crescimento permanente, que deve acompanhar e sustentar a pessoa consagrada em todos os ciclos de sua existência; de uma concepção de formação permanente que começa com a profissão perpétua, a uma concepção de formação permanente como modo teológico de ser, como alma de todo o itinerário formativo, desde o primeiro passo na vida religiosa até o último suspiro, quando entregamos nossa vida a Deus.

 

Capítulo II - A vida religiosa no brasil: desafios e propostas para um plano de formação permanente

Primeiramente foi estudada uma maneira de organizar uma formação permanente que responda aos desafios da refundação. Em seguida, se fez o exame de algumas orientações fornecidas pela CRB e por alguns teólogos Latino-americanos, em mérito ao argumento.

Todo o esforço da primeira parte do capítulo segundo foi direcionado a intuir a nova concepção de formação permanente que está vindo à luz nos últimos anos.  Em seguida, foram propostos alguns elementos essenciais que podem servir de inspiração aos Institutos Religiosos que desejam elaborar um plano de formação permanente que considere todo o trabalho formativo como uma grande e única obra de configuração a Jesus Cristo. E finalmente, foram apresentadas algumas sugestões que podem ajudar a elaborar um projeto de formação permanente, que leve em consideração o ordinário da vida cotidiana, com todas as suas oportunidades de formação permanente.

 

Refundar é dispor-se a criar um novo projeto evangélico de vida, capaz de contrastar o modelo vigente na sociedade.[10] Para construir este novo estilo de vida, é necessário, em primeiro lugar, deixar-se modelar pelo Espírito do Senhor; ter a coragem e a força de remar contra a maré, avançar para águas mais profundas e mergulhar na refrescante torrente do Espírito: "Ponham os olhos no futuro, para onde o Espírito vos impele, para continuar fazendo com vocês grandes coisas" (VC, n.110).

A diminuição do número de vocações,[11] às vezes, faz alguns Institutos Religiosos, ceder à tentação de esconder as radicais exigências do seguimento de Jesus Cristo, para facilitar o ingresso de candidatos. Isso é desastroso para um novo modelo de vida religiosa, que precisa contar com pessoas corajosas, convictas, dispostas a abraçar este ideal por amor, com todos os desafios que isso comporta.

Decisivamente chegou o momento de trocar a obsessão pela quantidade, por uma convicção pela qualidade. Para ser sinal não é necessário ser uma multidão.[12] Se o fermento é de boa qualidade, basta pouco para fermentar uma grande quantidade de massa. A formação permanente, neste contexto, deve ajudar a superar os conflitos interiores, as crises existenciais e tornar os religiosos cada vez mais, testemunhas qualificadas do Evangelho.

Enquanto houver homens e mulheres apaixonados por Jesus Cristo e pelo seu Reino, haverá vida religiosa. É esta experiência teologal de comunhão, de relacionamento pessoal e íntimo com o Senhor, de partilha de vida e ideal com os membros do próprio Instituto e com todo o povo de Deus, que dá sentido à vida religiosa. É necessário, pois, que os religiosos sejam para o mundo, uma memória viva de Jesus.[13]

Um retorno sincero, humilde e radical ao seguimento de Jesus Cristo é o caminho que a vida religiosa consagrada deve trilhar, se quiser recuperar originalidade, credibilidade e fecundidade.[14]

O trabalho da formação permanente é, em primeiro lugar, algo profundamente pessoal, porque é a graça de Deus agindo no coração da pessoa, impulsionando-a a uma sincera conversão. Quem não se dispõe a fazer esta viagem para dentro de si, optando por ficar somente na superfície, nunca irá experimentar a máxima evangélica: "Se o grão de trigo não cai na terra e não morre, não produz fruto" (Jo 12, 24). Sem a coragem de morrer para si mesmo e abandonar-se nas mãos do Senhor, não se produzirá frutos que permanecem para a vida eterna.[15]

Um dos grandes desafios de hoje, é fomentar nos religiosos a capacidade de testemunhar a vivência da gratuidade, da fraternidade, da solidariedade, da humildade, da pobreza, da obediência, da castidade, como alternativa às relações pautadas pelo lucro, pelo poder, pelo prazer. Viver com radicalidade a mística própria da vida religiosa é o caminho para superar o individualismo, o subjetivismo, o emocionalismo que impedem a alteridade, o diálogo profundo com Deus, o relacionamento fraterno com os outros, o respeito para com todas as criaturas.[16]

Foram analisadas as tendências e orientações da formação permanente no Brasil, sobretudo através dos escritos de alguns teólogos e de algumas orientações oferecidas pela CRB. Todavia se pôde constatar que, não existe um pronunciamento oficial da Conferência dos Religiosos em mérito à formação permanente que possa servir como instrumento orientador para todos os que atuam nas mais diversas realidades da sociedade brasileira.

A CRB optou por organizar a formação permanente nos próprios regionais, respeitando assim as enormes diferenças culturais, por exemplo, entre o norte e o sul, entre o leste e o oeste do País. As equipes de formadores dos Regionais têm mais chances de conhecer a realidade, as dificuldades e necessidades concretas daqueles que vivem e atuam naquela determinada realidade.

No esforço de ressaltar a permanência, como o fundamento de todo o itinerário formativo, foram descritos alguns elementos essenciais que poderiam fazer parte de um plano de formação inicial e pós-inicial, dentro desta perspectiva. Além disso, se propôs a elaboração de projeto pessoal e comunitário de formação permanente, como um instrumento capaz de ajudar os religiosos a permanecer sempre empenhados no entusiasmo do vigor inicial.

Tendo presente que todas as experiências de formação permanente estão direcionadas para o bem e o crescimento integral da pessoa consagrada como um todo, se analisou no último capítulo, como esse processo acontece concretamente, ao interno de um Instituto Religioso.

Ao concluir a análise do capítulo segundo, dedicado à vida religiosa no Brasil, se pôde perceber que a urgência de investir na formação permanente dos religiosos que se dedicam aos mais diversos campos de atuação neste país, continua mais viva do que nunca. Diante dos mais variados desafios que sociedade brasileira atual está colocando aos religiosos, se torna inevitável uma verdadeira refundação, uma volta à raiz fundamental da vida religiosa e do Instituto, para buscar na Fonte originária, novas luzes que possam iluminar a escuridão do momento presente. Isso passa necessariamente por um novo modo de conceber a formação permanente, como paradigma e mola propulsora de todo o processo formativo.

É importante perceber que neste elaborado se seguiu uma lógica, partindo do universal para o particular: no primeiro capítulo, se aprofundou a questão da necessidade da formação permanente, tendo como base a normativa canônica universal. No segundo capítulo, foi abordado a problemática da formação permanente dos religiosos que atuam no contexto de um território específico. No terceiro capítulo se analisou mais especificamente, como se aplica a normativa geral em uma realidade peculiar, ou seja, como a formação permanente foi e continua sendo dinamizada ao interno da Congregação das Irmãs Franciscanas de São José.

 

Conclusão

Considerando a índole conclusiva deste epílogo, se faz necessário chamar a atenção para alguns aspectos que, certamente, ajudarão a melhor compreender o caminho percorrido, o nexo entre os argumentos abordados, bem como a evidenciar o valor concreto da pesquisa desenvolvida e os resultados obtidos:

1. A legislação do CIC-1917 não faz alguma referência explicita à formação permanente. Todavia, tratando das três etapas da formação à vida religiosa (postulado, noviciado, profissão temporária), apresenta alguns elementos que poderiam ser lidos em chave de formação permanente, porque indicam uma dinâmica de continuidade.

2. Os documentos emanados após o CIC-1917, deixam transparecer a solicitude da Igreja em promover a contínua formação dos operários e operárias do Evangelho. Por detrás da aparente rigidez das prescrições jurídicas do Código, se esconde o rosto de uma Igreja que é Mãe e Mestra, que continua a indicar a estrada certa aos seus filhos, especialmente àqueles que se consagram inteiramente a Deus, mediante a profissão dos conselhos evangélicos.

3. Mas será necessário esperar até Concílio Vaticano II, para assistir a um verdadeiro salto de qualidade, em matéria de formação permanente. A concepção de formação, como exclusiva preparação à vida religiosa e apostólica, dará lugar a uma compreensão de formação, como caminho de crescimento progressivo e integral, que deve durar toda a vida. Com o decreto Perfectae Caritatis, se tornou claro que a formação espiritual, doutrinal e prática ultrapassam os estreitos limites do período da formação inicial.

A dimensão espiritual assume uma importância capital, pois através do sério cultivo da vida de oração e intimidade com o Senhor -  fonte e sentido de toda a comunhão fraterna - se torna possível observar fielmente os conselhos evangélicos, renunciando a tudo aquilo que distancia do verdadeiro seguimento a Jesus Cristo. A contínua formação doutrinal e prática, ancorada na formação espiritual, deve conduzir os religiosos e religiosas ao testemunho autêntico de uma vida transparente, de generosa entrega a Deus e ao serviço da Igreja, segundo a índole e a espiritualidade própria do Instituto.

4. A partir da madura orientação oferecida pelo Magistério Conciliar à formação permanente, surgirão no imediato pós-concílio, válidas normas aplicativas e programas operativos sempre mais amplos, que favorecerão uma extraordinária evolução destas orientações. De fato, a normativa pós-conciliar apresenta a formação permanente como um instrumento indispensável na assimilação da herança conciliar. Esta formação, deve conduzir progressivamente a pessoa, a sentir necessidade de voltar sempre de novo a Deus, como fonte, origem e sentido de todo crescimento humano-espiritual; deve ajudar a adquirir uma unidade de vida interior, fazendo com que as duas dimensões: contemplativa e ativa, se tornam parte de um mesmo processo de crescimento. Deste modo, a oração ilumina o agir e o agir revitaliza a oração. Para alcançar esta unidade de vida interior, se faz necessário perseverar em uma dinâmica de progressiva formação integral, enraizada no ordinário e extraordinário da vida.

5. A formação permanente vai encontrar a sua plena consolidação na normativa do CIC-1983. As experiências adquiridas nos anos passados entre a celebração do Concílio e a elaboração do Código, ajudaram a aprofundar o valor da formação permanente, como um empenho de toda a vida. A qualidade da própria consagração, da vida comunitária, da efetiva participação e co-responsabilidade na vida e missão da Igreja e do Instituto, vai depender deste contínuo empenho de formação.

A própria colocação do cân. 661, deixa transparecer que não existe uma ruptura entre a formação inicial e a formação permanente. Ao contrário, em harmoniosa continuidade com as etapas precedentes, a formação permanente acontece, antes de tudo, no coração da própria pessoa consagrada, através da contínua assimilação dos valores evangélicos, no cotidiano empenho de configurar a própria vida àquela de Cristo, na experiência pessoal e comunitária da vida de oração, na meditação da Palavra de Deus, na participação assídua aos Sacramentos. Realiza-se ainda, por meio do empenho aos estudos próprios deste gênero de vida e aos estudos direcionados a uma profissionalização, que ajude a melhor servir o povo de Deus, segundo as modalidades peculiares do próprio carisma. A formação permanente, portanto, é um processo de crescimento contínuo, que abraça a esfera espiritual, doutrinal e prática. Devido à sua importância, deve ser cultivada, em primeiro lugar pelos próprios consagrados (as); mas também garantida pelos superiores a todos os membros do Instituto.

6. Mesmo que a normativa do CIC-1983 já tenha colocado em evidência, de modo claro e preciso, o nexo de continuidade entre a formação inicial e a formação permanente, como parte do mesmo processo de crescimento e maturação da pessoa, novas orientações foram emanadas posteriormente, no sentido de ajudar os Institutos Religiosos a entrar nesta dinâmica e a elaborar uma Ratio Institutionis que contemple esta nova perspectiva de formação. Três documentos se revelam particularmente significativos neste contexto: a instrução Potissimum Institutioni, a exortação apostólica pós-sinodal Vita Consecrata e a instrução Partir de Cristo.

7. Toda essa dinâmica de formação permanente desencadeada nos últimos quarenta e cinco anos, encontra a sua aplicação prática também ao interno da vida religiosa no Brasil. A nova concepção de vida religiosa, suscitada pelo Concílio, inspirou uma série de experiências inusitadas: pequenas comunidades religiosas, estilos de vida mais simples, inserção em meios mais pobres, contato com a realidade dura do povo trabalhador, participação crescente na luta pela justiça. Paulatinamente, este estilo de vida religiosa no Brasil, passou de experiência isolada, para verdadeira alternativa de vida e de apostolado. Com isso, sentiu-se a necessidade de formar melhor os religiosos, para que pudessem inserir-se nessa realidade, sem perder de vista o essencial. A opção pelos pobres e o compromisso pela justiça, como apelo evangélico, representavam um forte desafio para a vida religiosa no Brasil e por isso se devia formar os religiosos para responder a estes desafios de modo maduro, eficaz e coerente.

Sobretudo a partir dos anos setenta, os Institutos Religiosos, sentiram mais fortemente a necessidade de investir na formação permanente dos consagrados e consagradas, não limitando-se à dimensão espiritual. Pois, além de autênticos servidores do Evangelho, os religiosos precisavam conhecer em profundidade a realidade sócio-cultural concreta do povo brasileiro, com seus problemas, suas angústias e suas esperanças.

Apesar de todos os esforços realizados pelos Institutos Religiosos neste sentido, ainda hoje, inúmeras dificuldades assolam a vida religiosa no Brasil, impedindo, em certos casos, que os religiosos se comportem como mediação significativa do Evangelho. Estes problemas se agravam, quando se tenta reproduzir uma imagem de vida religiosa, ditada por parâmetros impostos pela sociedade moderna e não pelo Evangelho.

Realizando esse estudo, se constatou a necessidade de repensar um novo estilo de formação permanente,  que não se limite ao simples aggiornamento ou aquisição de conhecimentos abstratos, mas que ajude os religiosos a desempenhar a própria missão com liberdade interior, com fé, com inteligência e sobretudo com grande amor à Causa do Reino. Se trata, portanto, de uma formação que envolva todo o ser e todos os ritmos da vida da pessoa; que seja capaz de despertar no coração dos religiosos e religiosas, uma verdadeira paixão por Jesus Cristo e paixão por esta humanidade, tão sofrida e carente de valores transcendentes.

8. No esforço de suprir, de algum modo, esta lacuna na formação permanente, a nível nacional, se procurou oferecer algumas sugestões práticas para a elaboração de um plano de formação permanente unitário, que não faça dicotomia entre a fase inicial e a fase pós-inicial da formação permanente.

Mesmo que alguns autores tenham insistido, ultimamente, nesta visão de formação, não existem ainda propostas concretas de como elaborar um plano que contemple este novo modo de formar-se. Por isso, recolhendo dados de autores que escreveram sobre o argumento, foram lançadas algumas proposta para um plano de formação integral, que abrace o passado, o presente e o futuro da pessoa consagrada: desde o despertar da primeira afeição até o momento supremo do encontro definitivo com o Senhor. Um plano de formação, cuja força propulsora seja a continuidade, que como tal, se articula em duas grandes fases, pertencentes ao mesmo e único itinerário formativo: a formação permanente inicial e a formação permanente pós-inicial.

A formação permanente inicial compreende: o tempo do despertar da vocação; os primeiros passos neste estilo de vida; o tempo da perseverança no querer; o período do aprofundamento e fortalecimento da própria vocação e a experiência temporária, mas real e concreta da consagração total ao Senhor.

A fase da formação permanente pós-inicial, não consiste em um programa extraordinário de vida, mas na dinâmica humilde e bem acentada de crescimento em Deus. Se realiza no caminho cotidiano do próprio contexto habitual da vida, com os instrumentos, os meios, os exercícios, as oportunidades e as pessoas que a vida coloca diante da pessoa consagrada a cada dia. Especialmente nesta fase, que será, certamente a mais longa, a comunidade religiosa assume uma importância capital. É a comunidade, de fato, que deve oferecer o terreno fértil, onde o Pai agricultor possa cultivar a boa semente, lançada no coração dos seus eleitos, para que possam produzir frutos abundantes durante toda a vida.

10. Formar-se na vida religiosa, segundo essa perspectiva, significa entrar e perseverar num processo de contínuo crescimento e cultivo da própria vocação. Este processo acontece concretamente, ao interno de um determinado Instituto Religioso, que por sua vez, deve dispor de instrumentos e métodos que indiquem, de maneira clara e dinâmica, o caminho a ser trilhado para assimilar a espiritualidade e a mística do Instituto. Para demonstrar concretamente este aspecto, se delineou a evolução histórica da formação permanente, na normativa fundamental da Congregação das Irmãs Franciscanas de São José, desde as origens até o presente. Foi empregado grande esforço para identificar, em cada época, elementos que ajudassem a compreender a dinâmica de formação permanente, que veio sendo transmitida de geração em geração, de documento em documento.

 

 

 



[1] CIC - 1917, cân. 488, n. 1: "Religião": é uma sociedade, aprovada pela legítima autoridade eclesiástica, na qual os membros, segundo as leis próprias da sociedade, emitem os votos públicos: perpétuos ou temporários, os quais se deve renovar após o vencimento do tempo para os quais foram emitidos, e deste modo tendem à perfeição evangélica"; n.2: "Congregação religiosa" ou simplesmente Congregação: a religião em que se emitem somente os votos simples, sejam perpétuos ou temporários.

[2] Cf. CIC-1917, cân. 590.

[3] "Omnes et singuli religiosi, superiores aeque ac subditi, debent, non solum quae nuncuparunt vota fideliter integreque servare, sed etiam secundum regular et constitutiones propriae religionis vitam componete atque ita ad perfectionem sui status contendere" (CIC-1917, cân. 593).

[4] Cf. Ioannes Papa XXIII, Const. ap. Humanae Salutis, 1961 dec. 25, in: AAS 54 (1962), p. 13.

[5] O cân. 724, ao referir-se à formação dos membros dos Institutos Seculares, também apresenta esta visão de formação permanente.

[6] Cf. S. Bisignano, La formazione alla vita religiosa, p. 716.

[7] Cf. PC, n. 15.

[8] "Institutum debet sodalibus suppeditare omnia quae ad normam constitutionum necessaria sunt ad suae vocationis finem assequendum" (CIC-1983, cân. 670).

[9] Cf. VC, n. 69-71. Particularmente importante se apresenta o n. 70, no qual são descritos os ciclos vitais do crescimento humano e religioso das pessoas consagradas. Uma atenção especial é dedicada ao tema das situações conflitivas e das provações que podem sobrevir a cada idade. Por isso no número 69 se lê que nenhuma fase da vida pode considerar-se tão segura e fervorosa a ponto de excluir a oportunidade de específica atenção, para garantir a perseverança na fidelidade. Não existe idade que se possa considerar terminada a maturidade da pessoa.

[10] Cfr. A. Roy, A refundação da Vida Religiosa, in: Convergência, an. 34 (1999), p. 173.

[11] "A escassez ou a ausência de vocações, que tanto preocupa hoje as Congregações, é só um sintoma de uma enfermidade mais profunda: a falta de sabor, de fé radical, de experiência de Deus, de qualidade evangélica, de seguimento radical" (F.M. Díez, Vida religiosa: carisma e missão profética, São Paulo, 1995, p. 58).

[12] Cfr. J. M. Guerrero, Vinho novo em odres novos, p. 40.

[13] Cfr. J. M. Guerrero, Vinho novo em odres novos, p. 41.

[14] Cfr. F. Martinez, La frontera actual de la Vida Religiosa: bases y desafios de la refundación, Madrid, 2000, p. 74.

[15] Cfr. L. Kearns, A refundação da vida religiosa, in: Convergência, an. 35 (2000), p. 183.

[16] Crf. B. Carranzza, Lógica e desafios do contexto religioso contemporâneo, in: Palestras da XX AGO, Rio de Janeiro, 2004 (Publicações CRB), p. 50-51.