A liturgia do Advento e do Natal do Senhor nos apresenta o mistério da Encarnação sob vários aspectos e, conseqüentemente, com diversas e riquíssimas expressões:

A vinda do Filho de Deus no meio dos homens, fazendo-se carne: "e o verbo se fez carne e habitou entre nós" (Jo 1,14), tornando-se homem, pela infinita misericórdia de Deus, o Filho nos faz ter a possibilidade de nos tornarmos, também nós, filhos de Deus, portanto, partícipes do mistério mesmo da Santíssima Trindade, e tudo isso acontece por intermédio do novo nascimento através do Sacramento do Batismo, com o qual somos iluminados para viver segundo a graça que o Senhor nos concede cada dia, nos tornando moradas da Trindade!

Deus se comunica aos homens por meio de sua Palavra: "Deus nestes dias falou-nos por meio do seu Filho" (Hb 1,2). Esse modo especialíssimo da comunicação de Deus exige que estejamos com os ouvidos atentos a sua palavra que, de forma pedagógica nos convida a percorrer o tempo do Advento nas perspectivas de vigiar, anunciar e testemunhar o que ele opera na vida daqueles que o escutam e obedecem à sua Palavra, sendo o sublime exemplo dessa realização a Virgem Santa Maria em seu "faça-se em mim segundo a vossa palavra!" (Lc 1,38). Faça-se que é um compromisso renovado, com todo vigor, em todos os momentos que Deus exige que ela adentre mais profundamente no mistério: no nascimento em um majedoura, na fuga para o Egito, na apresentação do Senhor no Templo, nas Bodas de Cana... na Cruz!

A re-consagração do mundo dessacralizado pelo pecado: "Deus quis, por meio do seu piíssimo Advento consagrar o mundo" (anúncio natalício). Invadidos pelo puro consumismo, pela corrida de uma simples troca de presentes, quantos de nós deixou simplesmente passar esse tempo tão rico? Esquecendo-nos que o maior presente já nos foi dado, o Salvador e, tantos outros natais já se passaram sem que ainda, ofuscando a realidade do mistério pelas falsas luzes que não nos deixam ver bem, pudéssemos contemplar a verdadeira luz que veio no alto nos visitar, dirigindo os nossos passos e os do mundo, de todos os homens de boa vontade, no caminho da paz (cf. Lc 1,79).

Deus se manifestou aos homens sob a humilde figura de uma criança: "nasceu para nós um menino, um filho nos foi doado" (Is 9,6). Este menino é o dom de Deus, o maior presente que já se pode dar; contemplando a sua fragilidade não nos detenhamos nela, pois esse, que quis necessitar do mais simples cuidado, nascendo em uma situação de tanta precariedade, é o único Salvador do mundo e veio para salvar a todos, indicando que é o caminho a verdade e a vida (Jo 14,6), para todos aqueles que não sabem para onde deverão se dirigir, porque fecharam o ouvido do coração as moções do Espírito Santo.

A liturgia ainda acrescenta um outro aspecto da Encarnação do Verbo: uma visita extraordinária do Senhor no meio de nós, do "Deus-conosco", que caminhou na história, que deu a sua vida, armando sua tenda, sua morada e que continua presente, de modo sublime na Santíssima Eucaristia, na Palavra proclamada, na presença do irmão, sobretudo, naquele que sequer pode celebrar este ano e talvez, tantos outros, o seu natal e, infelizmente também não nos apercebemos disso.

E o Natal já se foi... será que preparamos um presépio? será que preparamos o nosso coração? o Senhor quer nascer, cabe a nós deixar que ele seja gerado em nossa vida; ainda há tempo de deixar que ele possa encontrar lugar para morar na vida de tantas crianças que a lei do homem, de modo desumano, que dar fazer direito aquele de não poder chegar sequer a viver.

D. Hugo da Silva Cavalcante, OSB