Morri. Puxa, tinha um medo enorme de morrer! Não sabia o que iria encontrar deste lado. Estou no além, ou melhor, sou no além, porque a condição fúnebre é permanente. Agora é tarde, Edson é morto.  Era tão apegado à vida, em que pesem as desilusões e a rotina. Ah! a rotina! Como a rotina me dilacerava! Aqui, no além - se é que posso me expressar assim - não há tempo. Tudo é um instante!

E os livros? Onde estão os livros que eu gostava tanto de ler? Uma das poucas coisas que me davam prazer em vida... No além não há leitura, apenas uma eterna e momentânea contemplação. Não adianta tentar descrever o que sinto e vejo "agora", com os olhos da alma (o advérbio "agora" é tempo; paradigma de quem vive). É impossível descrever. Aliás, está escrito algures na bíblia que entre os que somos aqui e os que estão aí na existência, surge uma distância intransponível.

Não sinto saudades de nada. A propósito, não sinto nada. Quando vivo, não degustava absolutamente nada também. Os dias já não faziam sentido; eram uma seqüência interminável de repetição: acordar, estudar, trabalhar, dormir, acordar...

A única coisa que percebo de maneira clarividente, alumiado por um enorme archote, que dista tanto de mim, é que em vida poderia ter amado mais as pessoas. O desamor, ou melhor, a falta da prática do amor causou em mim um vazio sem fim. Este vazio me acrisola na situação mortal em que me encontro. Meu Deus, o amor!

Edson Luiz Sampel