Edson Luiz Sampel

Parece incrível como as coisas se repetem. Todo dia a gente tem de trabalhar, ir à escola, enfim, executar as mesmíssimas tarefas. Daí, então, fica-se a pensar: será que o sentido da vida está neste automatismo? Sou otimista com relação ao ser humano. Assim, estou próclive a responder negativamente.

O problema crucial da humanidade é lidar com o tempo. A propósito, creio que sempre foi assim. Contudo, antes de inventos como a televisão, as pessoas se reuniam mais vezes e paravam um pouco para degustar a leitura de livros. Hodiernamente, o que é bastante comum é a pessoa se postar em frente do televisor e lá ficar por horas, contemplando a fantasia, sonhando acordada. Enquanto isso, a vida passa. Nós, porém, vítimas da tecnologia e - pior - da ideologia neoliberal, nem sequer percebemos que as horas, os dias e os anos estão a voar... Para empregar um termo da filosofia marxista, estamos assaz alienados. Estar alienado é encontrar-se fora de si mesmo. É o que sucede com o homem coevo: ele não sabe quem é, tampouco está consciente dos seus objetivos; apenas põe-se a comer, trabalhar, dormir etc. Aliás, o capitalismo dominante inculcou-lhe a idéia de que o trabalho é extremamente necessário e de que é a razão da existência de qualquer ser pensante.

Se quisermos ter uma medida desse dia-a-dia, socorre-nos o psiquiatra espanhol Henrique Rojas: o homem atual é o homem light. Tal como esses alimentos insípidos, o homem light não tem sustância; é um caniço agitado, que muda de opinião a cada instante, ou melhor, não possui opinião formada acerca de nenhum assunto. Apenas segue a maioria (vox populi vox demoni).

Quando tomamos consciência desse dia-a-dia, temos a impressão de deparar com uma cena do inferno de Dante. Sem dúvida, o inferno é a monotonia, o tempo que gostaríamos de ver aniquilado, mas que eternamente nos atormentará. Será que nosso dia-a-dia é um inferno? Ou será que é um purgatório? Sim, porque se o purgatório tem o condão de acrisolar, isto é, de purificar, de fazer amadurecer, o inferno, por seu turno, simplesmente nos consome, nos extermina pouco a pouco. Se nosso quotidiano for avassaladoramente maçador, que o arrostemos como um purgatório!

A solução é a criatividade. A solução é o amor. Estes são os dois ingredientes para transformar o nosso dia-a-dia. Até mesmo as atividades comezinhas ganharão outro significado. O exercício do amor redundará numa outra visão de nós mesmos. Todo dia sentir-nos-emos responsáveis pelos pobres, pelos inermes. Este é o caminho, está é a saída. O resto é loucura que não paga a pena viver.