Em alguns lugares do Brasil, pratica-se a “devoção” ao Divino Pai Eterno. Há até um grande santuário em Goiás consagrado a esta piedade.   
Creio que a aludida prática religiosa necessita de algumas balizas teológicas e pastorais. Em primeiro lugar, sabemos que a Santíssima Trindade são três Pessoas (Homossious): o Pai, o Filho e o Espírito Santo. O Pai não tem missão propriamente; têm-na deveras o Filho e o Espírito Santo. O Filho é Jesus Cristo, Deus encarnado, cuja missão é salvar os homens do pecado. O Espírito Santo possui a missão de assistir diuturnamente a Igreja, sobremodo através dos sacramentos. É bom esclarecer igualmente que a Santíssima Trindade não são três “indivíduos”, caso contrário haveria três deuses. Os cri st&atild e;os somos rigorosamente monoteístas.
Só conhecemos o Pai por intermédio de Jesus: “Quem me vê vê o Pai” (Jo, 12, 45). Logo, toda a economia (ramo da teologia sagrada que estuda o modo como Deus age na história) se fundamenta em Jesus Cristo. Por este motivo, seria inidônea uma liturgia não cristocêntrica e contraproducente um apostolado não cristocêntrico.
Antes de continuarmos nossa breve reflexão, um esclarecimento: no primeiro parágrafo deste artigo, grafamos o vocábulo “devoção” entre aspas, pois ao Pai Eterno (primeira Pessoa da Santíssima Trindade) devemos prestar o culto de “adoração” (latria).
São Gregório Nazianzeno escreve: “O antigo testamento contém a revelação do Pai, o novo apresenta-nos a revelação do Filho; depois da ascensão de Cristo manifestou-se a terceira Pessoa (...)” (Orat. Theol. 5, 27). Ao lume do escólio deste padre da Igreja, percebemos que Jesus de Nazaré é, por excelência, o porta-voz da boa nova comunicada à humanidade ultimamente, isto é, nos dias atuais e até o fim do mundo.  
Ao meditarmos acerca das interações ou pericoréses entre as três Pessoas da Santíssima Trindade, verificamos que Deus se revela historicamente em Jesus Cristo. Daí o corolário da centralidade no messias, salvador e redentor do mundo. Demais, leve-se em conta este esclarecedor comentário de Leão XIII:
"O risco que se corre no tocante à fé e ao culto consiste na possibilidade de eliminar a distinção entre as três Pessoas divinas, ou de dividir nelas a sua natureza única; porquanto a fé católica está em adorarmos um só Deus na Trindade (...). POR CAUSA DISSO, RECUSOU TERMINANTEMENTE INOCÊNCIO XII, NOSSO PREDECESSOR, AQUIESCER AOS ROGOS DOS QUE LHE SOLICITARAM A INSTITUIÇÃO DE UMA SOLENIDADE ESPECIAL EM HONRA A DEUS PAI" (Encíclica Divinum Illud Munus, n. 2, caixa alta do autor deste artigo).
A meu ver, a devoção ao Divino Pai Eterno carece de estudo mais acurado dos  especialistas, máxime dos trinitaristas e pastoralistas. Não é o caso de repudiar esta santa devoção, mas de depurá-la, enfatizando o cristocentrismo. O povo simples fica muita vez atônito e decerto existem fiéis que quando ouvem a palavra “pai eterno”, pensam em Jesus e não na primeira Pessoa da Santíssima Trindade.
Outro aspecto que não pode ser olvidado em nenhuma devoção, litúrgica ou paralitúrgica, é o papel eminente de Maria santíssima. A deípara não é o centro, que é Jesus Cristo, mas o culto a ela (hiperdulia) não é facultativo; porque não se pode ser cristão sem ser mariano, como ensinou o papa são Paulo VI (Alocução no Santuário de Nossa Senhora de Bonaria de Cagliari, 24/4/1970, AAS 62, p. 299). 

Edson Luiz Sampel
Professor da Faculdade de Direito Canônico São Paulo Apóstolo (da Arquidiocese de São Paulo).