MISTÉRIO DA IGREJA

(Palestra para o Curso de Agente de Pastoral)

As parábolas evangélicas que Cristo usou para falar da Igreja continuam a chamar a nossa atenção para uma compreensão dessa organização. Quando ela pareceu-nos profundamente humana pelo chamado de Cristo a cada um dos doze serem os fundamentos de sua obra, logo o Cristo a ela se referiu como o começo do Reino de Deus na terra.

O Semeador que lança a semente em terreno ora bom, ora pedregoso; o semeador que vê o joio crescer junto à boa semente; o grão de mostarda, o fermento, o tesouro escondido, a pérola e a rede de pescar, o festim nupcial, o rebanho que deve ser um só o ter Pedro como o Pastor, todos esses apelidos, ou melhor dizendo, essas referências, Cristo apontou sobre a sua Igreja que, por ser o começo do Reino dos Céus implantando aqui na terra, deixa-nos a todos desejosos de compreendê-la no mistério de Deus em que ela se tornou. E assim aconteceu pela singularidade de sua existência entre os homens e pela realidade divina que ela nos comunica, sobretudo na sua missão que é de conversão, conscientizar os homens a respeito do Reino dos Céus que "está entre eles". Foram esses os fundamentos que Cristo pregou na sua vida pública, sobre os quais nasce a Igreja, após sua morte a sua ressurreição, quando  o Espírito Santo veio sobre os doze.

Mistério. Por quê? O documento mais importante do Vaticano II nos afirma então, que "sendo Cristo a luz dos povos", essa claridade deve iluminar todos os homens, sendo a Igreja responsável por essa missão. Tarefa difícil sem dúvida alguma, pois comunicar aos homens o mistério da Salvação que é Cristo, quando ela mesma se revela MISTÉRIO na missão que desenvolve entre os homens. Assim, ao nos colocar diante da MISSÃO da Igreja, vamos rever todo caminho da Salvação planejado pelo Pai, quando nos deu o Seu Filho para trazer-nos de volta a uma comunhão com a sua vida divina, visto que em Adão pecamos, e à imagem de Cristo devemos nos conformar, isto é, nos assemelhar. Maravilhosa ação de Deus Trindade que, como diz o decreto conciliar, "estabeleceu congregar na santa Igreja os que crêem em Cristo". E os caminhos planejados pelo Pai para a constituição da Igreja se revelaram desde o povo de Israel, na Antiga Aliança, até o momento em que o Cristo, como já dissemos anteriormente, a ela se referiu como o começo do Reino de Deus manifestado na terra, manifestado visivelmente "pela efusão do Espírito Santo", atingindo então, sua universabilidade, quando consumada nos fins dos tempos, como nos diz Mateus no seu Evangelho, "e os anjos reunirão os escolhidos de Deus de um ao outro lado do mundo".

A gente falou aqui que, quando Cristo começou a sua pregação falando do Reino de Deus, estava fundando a sua Igreja, dando início à Igreja. Do Reino de Deus de que nos fala Cristo, devemos ter idéias claras e exatas. A chegada do Reino Cristo a confirmou com milagres, com a sua pregação e com a presença de sua pessoa divina entre os homens. Quem consegue ver nele o Messias, faz-se Igreja, está acolhendo dentro de si o Reino de Deus. Quem escuta sua palavra e a põe em prática, a observa em sua vida, está se unindo intimamente a Ele, a cabeça da Igreja que é chamada de "o corpo do Senhor", faze-se Igreja. Quem vê nos seus milagres, gestos de Deus, faz-se Igreja, pois os milagres de Jesus comprovam que o Reino de Deus chegou a terra.

Voltemos às figuras bíblicas iniciais que falavam do Reino de Deus. A semente, o grão de mostarda, o fermento, o tesouro escondido, a pérola e a rede de pescar, o festim nupcial, o rebanho único sob o comando de Pedro como pastor. Pois agora também vamos encontrar a sabedoria divina querendo nos fazer entender o mistério de sua Igreja através de imagens que, nos santos evangelhos, se revelam com um colorido todo especial, capaz de nos falar abertamente de natureza íntima dessa instituição humana e divina, nascida do amor extremado do Cristo, em comunhão com o plano salvífico do seu Pai. Não é difícil experimentar uma proximidade do que a Igreja é por dentro, através dessas imagens bíblicas de que vamos falar agora, a ponto de vermos através delas, a figura de Cristo na Igreja, mistério dado pelo Pai em favor dos homens, como nos diz São Paulo em uma de suas cartas apostólicas, para termos a salvação. Vamos então, às imagens bíblicas que nos falam da Igreja.

A Igreja é um rebanho de ovelhas, do qual a porta é Cristo Jo, 10, 7; 10,9. Ele é a porta deste redil, é o pastor (Jo 10,2) que nutre (Jo 10,11) e que está pronto para morrer, e dar a sua vida pelas suas ovelhas.

A Igreja é imaginada também como lavoura (Mt 21,33-43), plantada pelo verdadeiro agricultor que é Deus, imaginada ainda como o campo de Deus onde uma árvore foi plantada, tendo como raízes os patriarcas do Antigo Testamento, árvore esta que é Cristo e que ocupa todo esse campo de Deus, onde nós também nos sentimos partes dessa árvore como seus ramos, pois sem Ele não podemos vicejar e dar os frutos esperados.

Outra imagem da Igreja é aquela que fala dela como uma construção de Deus que tem a Cristo como a pedra angular, o único alicerce (1Cor 3,11) usado por aqueles que são chamados a trabalhar nessa construção.

Casa de Deus, morada de Deus ou tenda de Deus entre os homens, templo santo que chega a ser comparado à Jerusalém celeste, todas essas imagens complementares falam da Igreja como construção do grande e divino Artífice que é Deus.

Vamos nos deter finalmente nessa imagem da Igreja como a Jerusalém celeste que será chamada por São Paulo, no livro dos Gálatas (4,26) de nossa Mãe, e descrita no livro do Apocalipse (19,7) como a esposa imaculada do Cordeiro imaculado. Nessa figura amorosa da esposa, fala-se da Igreja como amada pelo Cristo de tal modo que cheia de bens celestiais, venha favorecer a todos nós seus filhos, com o conhecimento da caridade de Deus e do amor fiel que o Cristo lhe dedica. Esse aspecto celestial da Igreja quando comparada à Jerusalém terrestre, aquela que era o centro de toda a piedade do povo de Israel, vem acentuar os caminhos  que a Igreja percorre no mundo, sabedora desde o início de sua fundação de que é peregrina, de que vive como exilada, não perdendo nunca de vista as coisas lá  do alto, pois é lá que o seu divino esposo se encontra à direita do Pai, e onde sua vida será glorificada nele, no Cristo.

No modo como Cristo, sendo de natureza divina, assumiu a nossa natureza humana, foi morrendo e ressuscitando que Ele nos resgatou e nos fez criaturas, e através do seu Espírito, nos fez membros espirituais do Seu próprio Corpo. Dessa maneira, a sua vida divina chega a todos nós, membros espirituais do Seu corpo que constituem Igreja, a ponto de se dizer que a Igreja é o Corpo Místico (espiritual) de Cristão. São Paulo confirma essa declaração acima naquela célebre passagem, em 1Cor 12,12, quando ele diz: "Porque Cristo é como um corpo que tem muitas partes. E essas partes, mesmo sendo muitas, formam um só corpo". Nesse Corpo que é a Igreja, Cristo tem a primazia porque foi feito pelo Pai, o princípio, o primogênito entre todos os seres, vivos e mortos, sendo assim capaz de enriquecer esse corpo com os dons divinos (o grande dom do seu Espírito, a Graça e tudo que Dele nos advém) para que ele, o corpo, se desenvolva e chegue à plenitude de Deus que nos é dada n'Ele que é a nossa Cabeça. Façamos uma comparação para um melhor entendimento desse ponto sobre a Igreja. O sangue que circula em nosso corpo, percorre todo o nosso organismo, da cabeça aos pés, e se torna responsável pela boa ordem que em nosso corpo se estabelece e que lhe dá condições e garantias de sobrevivência. Assim, o Cristo ao nos dar o seu Espírito para bem sermos os componentes do Seu  Corpo, sendo um só e o mesmo Espírito na Cabeça e nos membros, nos mantém vivos, unidos e em plena atividade como membros  deste Corpo Místico chamado de Igreja.

Vamos nos voltar novamente para os Santos Evangelhos. Queimando etapas, Cristo monta a estrutura da sua Igreja, dá-lhe condição visível, de ser percebida na verdade da Salvação que tomou como bandeira afim de "santificar os homens e levá-los à verdade". Tem sido assim que os homens que buscam a Deus, se defrontam com o mistério da Igreja. Buscando a santidade do Reino de Deus e a verdade para serem realmente livres, os homens deparam, se defrontam com a Igreja constituída e organizada como uma sociedade reunindo em torno de si pessoas que decidiram seguir a doutrina dos Evangelhos, numa incessante de se assemelharem ao Cristo

Esta Igreja, "coluna e fundamento da verdade", como diz o Vaticano II, é aquela que foi entregue a Pedro (Jo 21,17) pelo próprio Cristo após sua ressurreição, também aos apóstolos para que a espalhassem no mundo inteiro, não deixando de dirigi-la, de regê-la. Essa mesma Igreja é visível, é identificável no Papa, sucessor de Pedro, e nos bispos, que regem em comunhão com o Papa, a  Igreja dos nossos tempos. Se hoje esta Igreja  trabalha e reza para bem realizar a sua missão, continua a não dispensar o que lhe chega às mãos para realizar a sua tarefa da comunicadora da verdade e da graça de Cristo a todos os homens. Pois ela o sabe que, assim constituída, se torna visível no seu ministério, acessível aos homens que desejam saciar a sua fome do Deus, e permanece unida ao Cristo que lhe mantém a vida, a quem ela serve, trazendo novos membros que fazem crescer o corpo do Senhor.

Dentro dessa visibilidade, a Igreja nunca deixou de mostrar que todas as vezes que ela imita o seu Mestre e fundador, mais ela aproxima dos homens o seu mistério, Cristo, como o grande sacramento (sinal visível de uma unidade invisível) de Deus. Os traços da identidade da Igreja com o Cristo mostram-na seguindo os mesmos passos dados pelo Cristo no seu tempo de pregador da Boa-Nova para os homens. A Igreja visível experimenta a pobreza e o sofrimento assumidos pelo seu fundador, para melhor comunicar os frutos da Salvação. Na trajetória temporal da Igreja todas as vezes em que ela não viveu essa identificação com o seu Mestre, ela se mostrou imperfeita e carente na comunicação dos benefícios da salvação aos homens. A Igreja de Cristo experimenta também o comprometimento do Cristo com os pobres e fracos, os injustiçados e os marginalizados, encarando com espírito de verdade esses valores evangélicos sobre os quais ela hoje muito se questiona, se interroga para ter certeza de que prevalece nela a verdade do seu Mestre, o Cristo. Ela, se tem como pecadora, apesar de se ver depositária da santidade de Deus a comunicar aos homens. Por isso, na sua linguagem fala também de penitência e de renovação para si, para cada vez mais se ver a caminho de uma plenitude e de uma glorificação que lhe é prometida por Deus, ora chorando suas lágrimas diante da incompreensão dos homens por ela, ora consolando-se na imitação simples e evangélica do seu Mestre, sendo fiel ao anunciar a vida do Cristo morto e ressuscitado, o mistério do Cristo que transforma e liberta os homens. Ela  o faz com dificuldades, é verdade, mas com fidelidade heróica muitas vezes, até o dia em que ESSE MISTÉRIO DO CRISTO  de que foi feita portadora, irrompa em  plena luz e se torne manifesto, claro a todos os homens.