Acostumados que estamos aos constantes barulhos do mundo moderno e a agitação em que continuamente vivemos não nos deixa perceber que Deus, de fato, nos fala através do silêncio. Sempre me interroguei o por quê que tantos têm medo de estarem em ambientes que exigem o silêncio e, aos poucos, descobri que a existência de tal receio se deve ao temor de que, de fato, o silêncio é algo interpelador; ele nos questiona e não temos, tantas vezes, resposta para lhe dar, e é exatamente por esse motivo que queremos fugir dele, a todo custo. O ruído, sem dúvida, nos impede, portanto, de instaurar uma comunicação, um diálogo mais profundo e verdadeiro com Aquele que é a Palavra que brota do silêncio harmonioso.

A terceira edição típica da Introdução Geral ao Missal Romano = IGMR publicada durante o longevo pontificado de Sua Santidade o Papa João Paulo II e que foi enriquecida com as alterações da nova edição típica latina do Missal Romano, já traduzido para o Brasil, mas ainda a ser aprovado (recognitio) e publicado, conservou no transcurso da Celebração do Augustíssimo Sacramento da Eucaristia, momentos de silêncio que, lamentavelmente, não estão a ser devidamente respeitados, seja por parte dos próprios ministros sagrados, seja também, sem qualquer tipo de acepção, sobretudo, por parte dos fiéis leigos, participantes, cada um a seu devido modo, do próprio ato celebrativo. Nessa nova edição típica existe a completa novidade do Capítulo IX que trata das Adaptações que competem aos Bispos e às suas respectivas Conferências Episcopais que ao seu final assinala: "o Missal Romano apesar das diversidades de lugares e duma certa variedade de costumes, é instrumento e sinal admirável da integridade e da unidade do Rito romano", isso é afirmado em completa consonância com o que assinala a Instrução Varietatis legitimae.

Os templos sagrados, que são, por excelência, as igrejas catedrais as paroquiais, os santuários e as capelas ou oratórios hão de ser percebidos como lugares privilegiados da morada de Deus, que veio habitar no meio dos homens e, desse modo, com todo o esforço, portanto, o mais que possível, dentro deles, deve ser guardado o silêncio, que é um sinal de profunda reverência diante do sagrado, do mistério. Por tantas vezes estamos dentro de uma igreja, mas, entretanto, nos comportamos como se estivéssemos em um mercado, em uma praça, pois aí simplesmente conversamos em voz alta, fazemos cumprimentos, alguns até com o tradicional e tão brasileiro tapinha nas costas, incomodando, sobremaneira, aqueles que estão ali conscientes de que vieram para rezar. Não queremos falar daqueles que chegam atrasados para a celebração e ainda cumprimenta os que encontra pelo caminho.

A IGMR em seu número 45 de modo pormenorizado, chega a assinalar que: "já antes da própria celebração é louvável observar o silêncio na igreja, na sacristia e nos lugares que ficam mais próximos", é necessário, evidentemente, criar um espaço para que o silêncio venha a acontecer nesses ambientes, pois desse modo, todos, com maior facilidade e, devidamente, se dispõem com devoção a celebrar os ritos sagrados para os quais vieram; nesse mesmo número, que tem como título ‘O silêncio', citando a Constituição Sacrosanctum Concilium 30 do Concílio do Vaticano II e a Instrução Musicam sacram, recomenda-se que seja guardado o silêncio sagrado nos momentos próprios, que significam, nomeadamente, os momentos para um maior recolhimento interior, sendo esses:

a) no ato penitencial e depois do convite para as orações;

b) na breve meditação sobre o que se ouviu (após as leituras ou à homilia) e,

c) favorecendo a oração interior de louvor e de ação de graças (depois que se recebeu a Sagrada Comunhão).

Guarda-se também momentos de silêncio antes de se pronunciar a oração da coleta, logo após o oremos, "a fim de tomarem conhecimento de que se encontram na presença de Deus e poderem formular interiormente as suas intenções" (54, 127 e 259).

Pode ser oportuno, ainda assinala a IGMR, observar esses momentos de silêncio, adaptados à assembléia reunida, no início da própria liturgia da palavra, depois da primeira e da segunda leitura e após a homilia (cf. 45, 56, 66, 128, 130 e 136). É previsto também um tempo de silêncio na proclamação da oração universal (71).

A Oração Eucarística deve ser escutada pelos fiéis em silêncio (78), havendo apenas, como vem prescrito no Missal em uso atualmente em nosso país, a intervenção dos fiéis, mas isso deve ser feito no seu devido tempo. Para cada Oração Eucarística está prevista a participação dos concelebrantes, quer em simultaneamente, quer individualmente, deixando-se que somente, quando em simultaneamente, a voz do presidente seja ouvida, havendo ainda momentos em que somente o Presidente da celebração proclama os textos, permanecendo, assim, todos os concelebrantes em completo silêncio, o mesmo ocorrendo quando cabe a um dos concelebrantes proferir o texto que lhe compete (216-236).

Embora em algumas celebrações seja excessivo o número de cantos que são executados, há tantos parecendo que devem sempre chegar até o fim do texto, independentemente se é ou não o momento para serem ainda executados, a IGMR prevê que se faça silêncio nos momentos antes da comunhão (84) e depois da comunhão (45, 88, 164 e 271). O último momento que se prescreve para ser feito um instante de silêncio é antes da oração depois da comunhão (165). Nada assinalando sobre os breves avisos, que de breves, nada têm.

O meu ardente desejo é que redescubramos nas igrejas e, nomeadamente, na celebração ou concelebração da Ceia do Senhor o valor do silêncio e que o vivamos, afastando assim qualquer ruído que nos impeça de entrar em comunhão com nosso Deus, que nos fala no silêncio e que também é perfeita comunicação.

D. Hugo da Silva Cavalcante, OSB