Não há dúvida de que o cânon 1247, que obriga os fiéis a participar da missa aos domingos, é norma de direito eclesiástico (humano), e não de direito divino. Por exemplo, na Arquidiocese de São Paulo, certa feita, a Paróquia São Judas Tadeu (Região Episcopal Ipiranga, Setor Vila Mariana) propiciava o cumprimento do preceito da "missa semanal" às quintas-feiras, a fim de atender aos fiéis que, compulsoriamente, têm de trabalhar aos domingos. Desta feita, os bispos, ao lume do cânon 87, §1.º, podem dispensar do cumprimento do preceito no primeiro dia da semana, como ocorria na paróquia supramencionada.

            O problema surge ao verificarmos que a participação da missa uma vez por semana é preceito de direito divino. Com efeito, reza o terceiro mandamento do decálogo: "Guardar 'domingos' e festas". O descumprimento voluntário deste mandamento provoca o pecado mortal. Nenhum bispo, nem mesmo o papa, tem o poder de dispensar os fiéis deste mandamento da lei de Deus. Aparece, então, dilema terrível para os nossos amantíssimos pastores: permitir a missa nas igrejas, mas, ao mesmo tempo, contribuir para a proliferação da pandemia.  

            Juridicamente falando, creio que a melhor solução não consiste na dispensa facultada pelo cânon 87, §1.º, pois, dever-se-ia, então, eleger outro dia para a observância do terceiro mandamento do decálogo, o qual não pode ser dispensado.

Com todo respeito e reverência, sugiro (cânon 212, §3.º), destarte, aos senhores bispos que emitam comunicados e expeçam decretos, esclarecendo que, em virtude da situação grave da pandemia, os fiéis cumprem o preceito de direito divino se assistirem à missa ao vivo pela televisão, deixando claro que se cuida de dever moral e jurídico, e não mera recomendação, como se tem lido nalguns comunicados. Em minha opinião, não se deve mais falar em dispensa, simplesmente porque não é o caso de dispensa. Aliás, segundo o direito canônico, os fiéis estão obrigados a comungar uma vez por ano, e não uma vez por semana (cânon 920, §1.º). Este dispositivo legal patenteia a validade da missa televisionada. Reflitamos um pouco. Os primeiros cristãos, perseguidos pelo império romano, não recorreriam à televisão (visão de longe) se lhes fosse possível àquela época contar com tal recurso? Não seria aludido meio de comunicação expediente maravilhoso de se unirem ao bispo, que concentrava em si a celebração eucarística?  

Edson Luiz Sampel

Professor da Faculdade de Direito Canônico São Paulo Apóstolo

(da Arquidiocese de São Paulo)