Caríssimos irmãos e irmãs

Neste domingo, juntamente com o Apóstolo São Pedro podemos dizer: "É bom estarmos aqui" (Mt 17,4), reunidos junto do altar do Senhor para celebrarmos a Santa Eucaristia, onde encontramos com o nosso Mestre e Senhor. E também neste domingo somos convidados a subir ao Monte Tabor, a fim de meditar acerca da sugestiva narração da transfiguração de Jesus. O texto evangélico começa dizendo que “Jesus tomou consigo Pedro, Tiago e João, seu irmão, e os levou a um lugar à parte, sobre uma alta montanha. E foi transfigurado diante deles” (Mt 17,1s).

Na Sagrada Escritura, a montanha representa o lugar de proximidade e comunhão com Deus e de um encontro íntimo com ele pela oração. Recordemos também que, em um outro monte, o Sinai, Moisés recebeu os dez mandamentos.

O texto evangélico ressalta que se trata de uma nuvem luminosa que teria envolvido os discípulos com a sua sombra e dessa nuvem dizia uma voz: “Este é o meu Filho amado, no qual eu pus todo meu agrado. Escutai-o!” (v.5). A nuvem sagrada é o sinal da presença de Deus. Algo semelhante pode-se constatar no momento do batismo de Jesus, quando também uma voz, a partir do interior da nuvem, proclamou Jesus como Filho: "Eis meu Filho muito amado em quem ponho minha afeição" (v. 17). Mas a esta solene proclamação da filiação acrescenta-se agora uma ordem: a Ele devemos escutar (v. 5).

Este premente apelo a escutar o Cristo é um convite a deixar que a luz de Cristo ilumine a nossa vida e nos conceda a força para anunciarmos e testemunharmos o evangelho a todos. É um empenho que comporta, às vezes, não poucas dificuldades e sofrimentos.

Escutar é uma palavra que vem do latim “auscultare” e significa ouvir com atenção. É o mesmo que aguçar o ouvido. É estar consciente do que se ouve. Na Sagrada Escritura, com frequência, somos exortados a “prestarmos ouvido”. A parábola do Bom Pastor (cf. Jo 10,1-18) mostra a relação entre escutar, crer e obedecer. As ovelhas escutam a voz do Bom Pastor e fazem mais, seguem-no, o que supõe intimidade.

Escutar, seguir e conhecer Cristo é acreditar. Conhecer a voz de Cristo é identificar-se com a sua mensagem, senti-la como própria. Existe ainda um texto importante para compreender as exigências do escutar, que se encontra em 1Sm 3,10: “Fala, Senhor, teu servo escuta”. Esta resposta do jovem Samuel contém em si a atitude da completa atenção, atitude de obediência total à palavra de Deus (cf. Sl 33,12; 94,7-10; Mt 7, 24-27; Ap 2,7.11.17.29; 3,6; Pr 4,20. 5,1; 7.1).

Para São Bento a oração é, em primeiro lugar, um ato de escuta (cf. RB Pról. 9-11), que depois se deve traduzir em ação concreta, seguindo o caminho traçado pelo Cristo humilde e obediente (cf. RB 5,13), ao amor do qual ele nada deve antepor (RB 4,21; 72,11). Ouvir Cristo e obedecer a sua voz: este é o caminho real, o único, que conduz à plenitude da alegria e do amor.

O texto narrado por São Lucas ressalta: “Enquanto Ele rezava, o aspecto do seu rosto alterou-se e as suas vestes tornaram-se de uma brancura fulgurante” (Lc 9,29). Nisto, podemos dizer que a transfiguração é também um momento de oração, pois acontece um diálogo de Jesus com o Pai: a mais íntima unidade do seu ser com Deus, que se torna pura luz. Na sua unidade de ser com o Pai, o próprio Jesus é luz da luz, o ser de Jesus na luz de Deus, a luminosidade própria da sua condição de ser Filho.

Mas devemos também observar que a oração não exige o isolamento do mundo, como alguns podem imaginar, mas consiste, na verdade, em um contínuo subir ao monte do encontro com Deus, para depois voltar a descer trazendo o amor e a força que disto derivam, de modo a servir os nossos irmãos, conforme aprendemos no Evangelho.
As vestes brancas de luz, no livro do Apocalipse, indicam os vestes dos seres celestes, dos anjos e dos eleitos (cf. Ap 7,9). As vestes dos eleitos são brancas, porque foram lavadas no sangue do cordeiro (cf. Ap 7,14), porque, pelo batismo foram ligadas com a paixão de Jesus, e a sua paixão é a purificação que restitui a veste original, que perdemos pelo pecado (Lc 15,22). Por meio do batismo somos revestidos com Jesus na luz e passamos a ser também luz, por já estarmos iluminados por Deus, em virtude do batismo (cf. BENTO XVI, Jesus de Nazaré, São Paulo, 2007, p. 264).

Na transfiguração é Deus que se revela em Jesus Cristo. Portanto, quem quer conhecer Deus, deve contemplar o rosto de Jesus, o seu rosto transfigurado. Jesus é a revelação perfeita da santidade e da misericórdia do Pai. Podemos também dizer ainda que a transfiguração é uma revelação da pessoa de Jesus, da sua profunda realidade.
A finalidade desta transfiguração foi encorajar os discípulos para que não se deixassem vencer pelas provações que viriam em breve, com a paixão e morte de Cristo, por isto, a transfiguração de Jesus ocupa, nos evangelhos, lugar de especial importância, pois prepara os apóstolos para enfrentarem os dramáticos eventos do calvário, apresentando-lhes, com antecipação, aquela que será a plena e definitiva revelação da glória do Senhor no mistério pascal. Por isto, mediante este acontecimento, os discípulos são preparados para superar a terrível prova da paixão e compreender o mistério pascal de Cristo.

Ao meditarmos sobre esta página evangélica, preparamo-nos para reviver, também nós, os eventos decisivos da morte e ressurreição do Senhor, seguindo-o no caminho da cruz para chegarmos à luz e à glória. Possamos todos nós subir ao Monte Tabor para, com os discípulos de Jesus dirigir também o nosso olhar para o rosto radiante do Filho de Deus, a fim de sermos por ele iluminados.

E agora, ao celebrar a Eucaristia, Jesus nos dá o seu corpo e o seu sangue, para que, de certa forma, possamos saborear já aqui na terra a situação final, quando os nossos corpos mortais forem transfigurados à imagem do corpo glorioso de Cristo.

Peçamos a intercessão da Virgem Mãe de Deus, para que possamos reconhecer em Jesus o Filho amado de Deus e o Senhor da nossa vida. Que ela interceda por cada um de nós, para que possamos ser os discípulos fiéis de Cristo, escutando e colocando em prática todos os seus ensinamentos. Assim seja.

D. Anselmo Chagas de Paiva, OSB
Mosteiro de São Bento/RJ