Em 1994, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) publicou normativa intitulada “Orientações Pastorais sobre a Renovação Carismática Católica” (Documento 53). Trata-se de diretrizes canônicas, visando à readequação do movimento Renovação Carismática Católica (RCC) aos parâmetros litúrgicos e doutrinais do Catolicismo. 

No referido Documento 53 se consideram diversos pontos ambíguos do “pentecostalismo católico”. Passados 22 anos, o Documento 53 ainda está em pleno vigor. É verdade que o surto carismático arrefeceu sobremaneira. Contudo, pergunta-se: nessas duas décadas, mudou a práxis litúrgica ou paralitúrgica dos membros do aludido movimento, em obediência aos ditames estipulados pelos bispos? 

Quem sintoniza à noite certas emissoras de televisão, uma delas notório carro-chefe da RCC, assiste à “oração em línguas”. Preceitua, contudo, o Documento 53: “Como é difícil discernir, na prática, entre inspiração do Espírito Santo e os apelos do animador do grupo reunido, não se incentive a chamada oração em línguas (...)” (62). 

Respeitáveis e conhecidos sacerdotes, próceres do movimento RCC, continuam a utilizar o termo “batismo no Espírito”, sendo que o Documento 53 preconiza que “será melhor evitar o uso da expressão ‘batismo no Espírito’, ambígua, por sugerir uma espécie de sacramento” (54). 

Vários outros itens problemáticos elencados no Documento 53 foram ou não resolvidos pela RCC nesses dois decênios de vigência da normativa? Por exemplo: o uso indevido de vocábulos como “pastor”, “pastoreio”, “ministério”, “evangelizador” (29); a ênfase nos exorcismos (que necessitam de prévia anuência da autoridade eclesiástica e só podem ser administrados por padres) (67); o subjetivismo e sentimentalismo dos grupos de oração (46); o profetismo (63); o carisma ou o pseudocarisma de cura (58) etc. 

Ao emanar as regras do Documento 53, a conferência episcopal quis corrigir os desvios da RCC, prejudiciais tanto ao movimento quanto à Igreja (69). Não se negam os benefícios que a RCC proporcionou a muitos católicos, trazendo-os de volta ao grêmio da Igreja e inculcando-lhes os ensinamentos fundamentais da religião cristã. Sem embargo, as recomendações e determinações do Documento 53 tocam em pontos relevantes da fé, que não devem ser descurados por nenhuma associação ou movimento eclesial. Consoante reza o cânon 529, §2.o, incumbe principalmente aos párocos a obrigação de zelar e velar para que as prescrições do Documento 53 sejam rigorosamente observadas. 

Edson Luiz Sampel 

Doutor em Direito Canônico pela Pontifícia Universidade Lateranense, do Vaticano (PUL). Membro do conselho diretor da Academia Marial de Aparecida (AMA) e da União dos Juristas Católicos de São Paulo (Ujucasp).