A Santificação Conjugal e a Convivência Familiar ao lado dos Filhos*

 

* Este artigo faz parte da TESE de DOUTORADO intitulada

O Sacramento do Matrimonio segundo o Cânon 1055, § 1 e sua Aplicabilidade Pastoral no Brasil.

 

A família é um dos pilares da primeira evangelização e da transmissão contínua da fé em nossa terra. E permanece sendo o fundamento e primeiro impulso para nova evangelização por meio da vocação e do ministério que lhe é próprio, conferido no sacramento do matrimônio, raiz da família cristã. O matrimônio segue estabelecendo novos rumos no seu adequado regulamento canônico tanto em si mesmo como diante das novas circunstâncias, que incidem direta ou indiretamente, no seu desenvolvimento concreto. A nova compreensão das relações entre o homem e a mulher, a importância atribuída à qualidade das relações afetivas heterossexuais, as novas formas de matrimônio existentes, as mudanças realizadas nas relações paterno-filiais, a nova configuração que se dá a propriedades tradicionais do matrimônio, o reconhecimento jurídico cada vez mais generalizado de outras formas de vida materialmente semelhantes ao matrimônio, o novo conceito e compreensão do termo família, as atuais circunstâncias sociais e políticas e outras situações, são fatos que, queiramos ou não admiti-los estão presentes em nós, moldam o comportamento e configuram uma nova forma de entender o matrimônio bastante distinto de outras épocas não muito distante. Esclarecemos, de imediato, que não cremos tratar de uma crise negativa que ameaça a extinção do matrimônio, e da família, mas de novas formas de viver algo tão antigo e tão atual como é a relação conjugal entre o homem e a mulher.

O sacramento do matrimônio coloca Jesus Cristo, de modo muito especial e concreto, entre os esposos. O amor conjugal tem que ser profundo e progressivo, como o amor a Deus. Por isso, nem os obstáculos, nem as provações, nem a própria monotonia do dia-a-dia poderão deter - para quem ama a Deus - o matrimônio, que é sacramento e vocação, não pode se abalar quando chegam às dores e nos contratempos, que a vida sempre traz consigo. Devem recordar que foram chamados por Deus para formar um lar, onde deve amar-se sempre, com aquele amor entusiasmado que tinham quando eram namorados ou noivos. As contrariedades e os sacrifícios generosamente partilhados unem profundamente o casal. Nesse sentido, o espírito de sacrifício, o amor à cruz é indispensável para crescer na santidade conjugal.

Muito especialmente, é preciso saber sacrificar-se como a mãe na hora do parto, para dar à luz filhos bem formados e amadurecidos à sociedade. Santo Tomás diz que a família é como o "útero social", que vai engendrando e desenvolvendo os filhos, até a sua maioridade, para entregá-los ao mundo satisfatoriamente desenvolvidos1.

Esse empenho para conseguir a unidade do amor redunda também em beneficio dos filhos. O fruto mais substancial do amadurecimento espiritual dos esposos e a lição pedagógica mais importante que eles devem dar aos filhos é a da sua união sólida e inquestionável, que se dilata no relacionamento fraterno e dos filhos entre si. Por isso, o primeiro dever-compromisso dos pais para com os filhos é o de se amarem um ao outro. A primeira necessidade da criança é crescer num lar unido, estável e encontrar o seu pai e a sua mãe, vinculados numa única vontade. É por isso que os filhos vêm reforçar o amor entre os pais. Às vezes, inclusive, representam o único laço, que ainda os mantém unidos.

A Espiritualidade no lar: Oração Conjugal e a Vivência Familiar

Em virtude da sua dignidade e missão, os pais cristãos têm a tarefa especifica de educar os filhos para a oração, de introduzi-los na descoberta progressiva do mistério de Deus e no relacionamento pessoal com ele. Um fator importante da educação da fé é o aprendizado da oração. Esse aprendizado não se pode dar por suposto; é necessário aprender a rezar, voltando sempre de novo a conhecer esta arte dos próprios lábios do divino Mestre2. É desejável que a Pastoral Familiar junto com os Pastores e Agente de Pastoral possa ajudá-los nessa missão, por meio de subsídios, encontros, retiros, conferências e outras dinâmicas. A oração reforça a estabilidade da família, fazendo com que ela participe da «fortaleza de Deus»3.

Além das praticas de piedade como a recitação do rosário, a preparação dos filhos para os sacramentos da primeira idade: confissão, comunhão, crisma e com os vários subsídios de evangelização da Pastoral Familiar. Há uma parte essencial e permanente do dever de santificação é o acolhimento do apelo evangélico de conversão dirigido a todos os cristãos... No arrependimento e o perdão mútuo no seio da família cristã, revestem a vida cotidiana, encontram o seu momento sacramental especifico na penitencia cristã.

A Eucaristia é a fonte própria do matrimônio cristão. O sacrifício eucarístico, de fato, representa a aliança de amor de Cristo com a Igreja. Neste sacrifício da Nova e Eterna Aliança é que os cônjuges cristãos encontram a raiz da qual brota e é interiormente plasmada e continuamente vivificada a sua aliança conjugal. A participação na Eucaristia seja verdadeiramente, para cada batizado, o coração do domingo, o dia do Senhor, o ponto central da semana, o dia da esperança dos cristãos... um compromisso irrenunciável, assumido não só para obedecer a um preceito, mas como necessidade para uma vida cristã consciente e coerente4.

O diálogo é uma exigência intrínseca da própria evangelização. É missão de a família contribuir para educar as pessoas para o dialogo, a abertura ao irmão, a aceitação do diferente, o respeito mútuo e a difícil arte de saber ouvir. E pelos laços de amor que une seus membros, a família é convocada a ser a primeira experiência de fraternidade. Partilhando todos os dias do mesmo lar, do mesmo alimento, das mesmas alegrias e angústias, os membros da família acabam desenvolvendo o sentimento de um destino comum.

É muito importante que os casais encontrem na Igreja um suporte para poderem orientar os seus filhos a educação afetiva e sexual de forma consciente. Assim, poderão contrapor e superar a educação sexual proposta pelo Estado, com freqüência, imposta de maneira unilateral, sem abrir possibilidade a outras escolhas.  Pois a influencia dos meios de comunicação é fundamental: caracterizam a cultura atual e podem ser utilizados na difusão dos valores evangélicos5.

Família: Igreja Missionária e Domestica

A Igreja por sua natureza é missionária6. Os cônjuges e os pais cristãos são convocados a evangelizar a partir da família, pelos valores ético-cristãos. Um dos desafios para a Igreja no Brasil é evangelizar os batizados. Apesar de ser um país onde a maioria das famílias é católica - a capacidade de evangelizar essas famílias, é muito reduzida. Muitas vezes, no trabalho com as famílias, pressupõe-se uma evangelização que não existe. Apresentam-se conteúdos doutrinários sem levar as pessoas a um encontro pessoal com Jesus e a uma opção pessoal com ele e pelo Evangelho. É necessário partir do mais básico e fundamental, sem pressupor a existência de uma formação elementar para chegar aos alicerces. Corre-se o risco de edificar uma casa bonita, mas sem um fundamento sólido7. A família, de fato, pode e deve se tornar lugar privilegiado para realizar essa missão evangelizadora. Os pais não somente comunicam o Evangelho aos filhos, mas podem receber deles o mesmo Evangelho profundamente vivido8.

Nesse sentido, Ecclesia domestica impellitur ut splendidum signum sit praesentiae Christi eiusque amoris etiam pro «longinquis», pro familiis nondum credentibus, pro familiis ipsis christianis non amplius viventibus secundum fidem acceptam9. Essa instituição é, insubstituível e essencial, dentro do organismo social, foco irradiador de vitalidade cristã, pequena "Igreja domestica"10, imagem e reflexo da sagrada Família de Nazaré. Deste modo cônjuges e pais são testemunhas de Cristo até os confins do mundo e formando-os verdadeiros "missionários" do amor e da vida.

 

Fontes

[1] Cf.  R. Llano Cifuentes, Noivados e Casamento, orientações para solteiros e casados. São Paulo, 20002, 280.

2 Cf. Novo Millennio Ineunte, n. 32.

3 Ioannes Paulus II, Carta às Familias, n. 4.

4 Cf. Novo Millennio Ineunte, n. 36.

5 Cf Ioannes Paulus II. Adhortatio Apostolica Ecclesia in America, 4 augusti 1999, n. 72, in: AAS 91 (1999) 737-815.

6 Cf LG, nn. 25-27; PO, n. 4-6.

7 Cf CNBB, Diretório da Pastoral Familiar. ..., 131-132.

8 Cf. Paulus PVI, Adhortatio Apostólica Evangelii Nuntiandi de evangelizatione in mundo huius temporis, 8 decembris 1975, n. 71, in: AAS 68 (1976) 1-76.

9 FC, n. 54. A Igreja domestica é chamada a ser um sinal da presença de Cristo e do seu amor mesmo para os afastados, para as famílias que ainda não crêem e para aquelas que já não vivem em coerência com a fé recebida.

10 Cf. Moretto, A., Igreja Domestica, São Paulo, Loyola, 1986, (citado no Diretório da Pastoral Familiar). 132.

 

Autor

 

Pe Dr. José Donisete Pereira

Sacerdote da Diocese de Dourados - MS - Brasil

Doutor em Direito Canônico, pela Pontifícia Universidade Lateranense - Roma - Itália.

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