Jean Piaget, o cientista que estudou o desenvolvimento da inteligência na infância, ensinou que todas as habilidades humanas que serão desenvolvidas pelos adultos, têm sua origem na infância. É como se houvesse um arquivo da inteligência no cérebro cheio de pastas, cada uma delas guardando todas as informações que servirão de ponto de partida, para cada uma das atividades que serão desempenhadas pelo adulto. Com outras palavras: o fundamento das principais atividades da nossa vida deve ser apreendido na infância. Por exemplo, se ensinássemos a uma criança dirigir automóvel, ela seria um exímio motorista. Mas dirigir automóvel é uma atividade perigosa para crianças; além disso, carros são fabricados no tamanho ideal para adultos, não para crianças.

Conheço homens que aprenderam a ser mecânicos de automóveis, trabalhando com seus pais. Uma criança que aprende a manter o seu quarto arrumado e limpo, quando adulto, manterá o seu escritório sempre arrumado. Limpeza, higiene pessoal, boas maneiras, falar num tom normal, usar palavras corretas numa conversação, são hábitos que aprendemos na infância. É cada vez mais comum ver rapazes e moças que têm enorme dificuldade para evoluir no emprego, porque se sentem inferiorizados num ambiente profissional mais sofisticado. Ficam enrolados ao usar talheres numa refeição social. E não são pessoas que acabaram de chegar da roça; são pessoas que moram na cidade, freqüentam a escola do bairro e costumam passear no shopping. Mas, se você entrar na casa deles verá que não parece residência de pessoas educadas.

No terreno da inteligência infantil, também dizia Piaget, devem ser plantadas as sementes das principais qualidades humanas e artísticas. O exemplo clássico é o da música, da escultura, da pintura, da poesia e literatura. Os mais importantes artistas da humanidade começaram a trabalhar quando crianças. Foi trabalhando que desenvolveram a sua inteligência para a arte. O genial Michelangelo começou aos oito anos. João Carlos Martins, o nosso maior pianista da atualidade começou aos seis anos de idade. Se os gênios começaram cedo, também devemos ensinar nossas crianças a cumprir tarefas bem cedo. Antigamente, dizia-me uma senhora, as meninas quando brincavam, faziam a casinha, as bonecas e os acessórios da brincadeira. Hoje, elas não criam nada, já compram tudo feito, a brincadeira perdeu a criatividade. As crianças brincam com as máquinas; não há interação com outras crianças porque as mães têm medo que elas se machuquem. Nada aprendem e nada lhes é ensinado. Certa vez uma noiva me disse que não sabia fritar ovo. Quando perguntei como ela ia se virar como dona de casa, disse que "agora mamãe vai me ensinar".

Mas o território mais vulnerável desse processo de formação do ser humano é o do aprendizado dos valores. O jovem de hoje aprende uma cultura distante e estranha dos valores dos pais. A família não faz refeições junta; não se reúne para conversar sobre seus projetos para o futuro e dificuldades de convivência. As grandes decisões que tomamos na vida, como formação profissional e os negócios, nascem das conversas que temos em família na infância. Aí a inteligência começa a exercitar o projeto. Um adulto perseverante e disciplinado, depende de como foi organizada a sua cabeça na infância. Quem pensa que quando os filhos crescerem vão aprender a viver, é ingênuo. Os jovens de hoje são inseguros e vulneráveis devido à ausência de valores humanos e raízes familiares. Estão perdidos na convulsão social existente. Quem nada aprendeu a fazer quando criança, nada produzirá quando adulto.

Paulo Pinto é pároco de NS de Lourdes, no Parque Dez.