2009 foi o ano das decisões políticas do Supremo Tribunal Federal. Embora a Constituição defina a competência do STJ e do STF, a possibilidade das decisões dos Tribunais do país serem revistas por estes órgãos é ilimitada. Quando não há mais recurso, pode-se inventar um "recurso inominado" ou interpor um habeas corpus contra decisões de última instância, cuja matéria não está elencada na competência de ambos os Tribunais, como no caso do menino Sean Goldman. O direito clássico de família reza que o filho menor fica com os pais. Se a criança é disputada por pai e mãe, sai vencedor o instinto materno em obediência ao direito natural. Na ausência da mãe, ao pai compete o dever e o direito de cuidar dos filhos. A não ser que houvesse algum impedimento, como doença mental, dependência química, extrema pobreza ou inidoneidade moral. O magistrado de primeira instância que analisa cuidadosamente esses casos, entendeu que o pai preenchia todos requisitos legais para o exercício do seu direito. O padrasto, vencido nas instâncias do Rio, impediu o cumprimento da decisão recorrendo a Brasília. Mas a maior perplexidade foi a segunda instância federal do Rio de Janeiro decidir definitivamente favorável ao direito do pai, e o Supremo conceder liminar impedindo o cumprimento da decisão, sem nenhuma autorização constitucional, vez que a matéria não é de natureza constitucional nem controvertida. Padrasto não é parente e avós só podem requerer a guarda na ausência ou impossibilidade jurídica dos pais. Se a questão não tivesse sido resolvida rapidamente, teríamos fechado o ano com um recorde de decisões contrárias à lei e ao bom senso praticadas pelo Supremo. Veja-se o caso Cesare Battisti. Quem decide a extradição de terroristas é a Suprema Corte, em decisão última e irrecorrível, mas o Supremo criou instância nova: o Presidente da República. O poder Judiciário que já é fragilizado pelas constantes intromissões dos poderes Executivo, Legislativo e econômico, agora se torna, por jurisprudência da própria Corte, subordinado ao Executivo, criando, de direito, uma nova ordem constitucional. A mesma ratio teria ocorrido com a demarcação da reserva Raposa Serra do Sol, se a reserva estivesse localizada na Região Sudeste. Os ministros teriam produzido fundamentação jurídica para provar que é muita terra para poucos índios. E diriam que se tivéssemos que adotar a demarcação contínua transformaríamos noventa por cento do território brasileiro em terras indígenas. Que as cidades de Recife, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Salvador, pertencem aos índios. Que os agricultores estavam produzindo comida e riqueza na região. Que os índios não praticam nem a agricultura de subsistência. Que a área estava desocupada quando os colonos chegaram. Que os quarenta anos de posse mansa e pacífica são constitucionais. Mas, como nenhum ministro nasceu naquelas terras, nem os parentes nem os amigos deles, e as terras ficam no Norte do país e o presidente Lula quis, construíram o direito dos índios.

Paulo Pinto é pároco.