"Ao contrário, amai os vossos inimigos ..." (Lc 6,35a)

Jesus não veio revogar a Lei, mas sim levá-la à perfeição. A Lei evangélica instituída por ele não desvaloriza a Lei antiga, mas a ultrapassa e aperfeiçoa. Na lei do amor, a vingança dá lugar à misericórdia.

O Evangelho de hoje propõe a perfeição da misericórdia e nos dá como norma de conduta: "Amai os vossos inimigos" (Lc 6,27). A primeira parte do texto apresenta exemplo concreto desta forma de amor: oferecer a outra face, ceder o manto, dar ao que pede e emprestar a outra face, ceder o manto, dar ao que pede e emprestar sem juros (6,27-35). Termina com a "regra de ouro": "O que vós desejais que os outros vos façam, fezei-o também vós a eles" (6,31).

Trata-se de algo difícil de realizar. Mas Jesus nos dá uma importante motivação teológica para tal amor: "Então... sereis filhos do Altíssimo, porque Deus é bondoso também para com os ingratos e maus" (6,35)

Além disso, o Espírito Santo nos torna capazes de amar como Jesus ensinou. Os sacramentos nos comunicam a graça necessária para agirmos conforme os seus ensinamentos.

A segunda parte começa apelando de novo para uma razão teológica: "Sede misericordiosos como também o vosso Pai é misericordioso" (6, 36). Paralelamente, lemos em Mt 5,48; "sede perfeitos, assim como vosso Pai celeste é perfeito".

A Misericórdia é o tratamento dado pelo coração de Deus à miséria humana. Também nós somos chamados a "dar o coração aos míseros", a ser misericordioso, à imitação do pai celeste. Ser perfeito ou misericordioso como o Pai não significa atingir o grau de perfeição ou de misericórdia divina. Deus é a perfeição absoluta, enquanto o homem deve aspirar a ser perfeito tanto quanto lhe é possível.

A convivência diária nos apresenta inúmeras oportunidades de exercitar a misericórdia. Em geral estamos dispostos a suportar as fraquezas das pessoas mais queridas, das crianças, dos idosos, dos doentes ou dos loucos. Aí a misericórdia flui mais facilmente. Mas, quando se trata de lidar com pessoas egoístas, grosseiras, agressivas, dominadoras, competitivas, arrogantes, falsas, traidoras... a nossa disposição já não é a mesma.

Por que não as consideramos também como enfermas, como necessitadas de cura? Se o fizemos, certamente conseguiremos ser mais misericordiosos para com elas e contribuiremos para a sua cura efetiva.

"Ajudai-me, Senhor, para que os meus olhos sejam misericordiosos, de modo que eu jamais suspire nem julgue as pessoas pelas aparências eterna, mas perceba a beleza interior dos outros e possa ajudá-los

Ajudai-me, Senhor, para que os meus ouvidos sejam misericordiosos, de modo que eu esteja sempre avento às necessidades dos meus irmãos, e não me permitais permanecer indiferente diante de suas dores e lágrimas.

Ajudai-me, Senhor, para que a minha língua seja misericordiosa, de modo que eu nunca fale mal dos meus irmãos; que eu tenha para cada um deles uma palavra de conforto e de perdão.

Ajudai-me, Senhor, para que as minhas mãos sejam misericordiosas e transbordantes de boas obras e não se cansem jamais de fazer o bem aos outros, enquanto, de minha parte, aceitarei as tarefas mais difíceis e penosas.

Ajudai-me, Senhor, para que sejam misericordiosos também os meus pés, para que levem sem descanso ajuda aos meus irmãos, vencendo a fadiga e o cansaço: o meu repouso seja o servir a outros.

Ajudai-me, Senhor, para que meu coração seja misericordioso, se torne sensível aos sofrimentos dos outros; ninguém receba uma recusa do meu coração. Que eu conviva sinceramente, mesmo com aqueles que abusam de minha bondade. Quando a mim, me encerro no Coração misericordiosíssimo de Jesus, silenciando aos outros o quanto tenho que sofrer" (Santa Faustina).